segunda-feira, 12 de março de 2012


Luli Radfahrer

Príncipes e amantes

No mundo virtualizado, redes de relacionamento alimentam o amor eterno e o sexo sem compromisso

Sua cara-metade pode estar a um clique de distância. Ela pode ser do jeito que você precisa, mesmo que o tipo jamais tenha passado por sua cabeça.

A situação parece digna de livros de autoajuda, programas vespertinos de TV ou, pior, esquemas obscuros de pornografia ou prostituição. Como tudo na internet, também pode ser fantasia, tecnologia imersiva típica de videogame, realidade alternativa ou aumentada. Mas não é. São pessoas de verdade.

No mundo virtualizado das redes sociais, comunidades de relacionamento pessoal são cada vez mais populares no mundo.

Demasiadamente humanas, ali sobram corações e ventres, convivência e paixão. Cada encontro pode trazer a promessa de uma união de longo prazo ou de uma noite de sexo sem compromisso. Tudo depende da intenção e do lugar.

Elas podem ser divididas em dois tipos de ambiente: a pracinha da igreja e o clube de "swing". No primeiro, candidatos encabulados procuram conhecer o máximo de seu parceiro. No outro, o encontro é intenso, ansioso, visceral, sem tempo para conversa fiada. Em ambos, as relações têm um ar íntimo e privado, impublicável no Facebook.

Essas redes podem dar, a princípio, um ar derrotado, artificial, típico de pessoas inseguras, incapazes de lidar com variáveis deliciosamente imprevisíveis do jogo de sedução. Nada mais distante da realidade.

Quem vive em um grande centro urbano e está há algum tempo sem relacionamento estável sabe muito bem o quanto a sedução, pouco importa a idade, é romanceada. O mundo real é mais arriscado, cruel, egoísta, traiçoeiro e decepcionante.

As redes de relacionamento são ambientes racionais e pragmáticos, ideais para quem vive um cotidiano isolado, enclausurado e atarefado, sem tempo ou conexões suficientes para encontrar uma boa companhia. Podem cair muito bem para quem não se contenta com a reprodução em cativeiro e acredita que pode compartilhar de ideais mais profundos do que a missão, visão e valores da empresa em que passa a maior parte do dia.

A inteligência artificial de sistemas de relacionamento se baseia em um princípio comum a padres, shadchans judaicos ou comadres casamenteiras, mais interessados no que o candidato tem a dizer do que naquilo que ele deseja.

Depois de responder a dezenas (às vezes centenas) de perguntas a seu respeito, cada interessado é apresentado a perfis compatíveis.

Alguns, mesmo depois de tanto tempo e esforço, podem ser rejeitados caso sejam inconsistentes ou mal-intencionados.

O sistema parece agradar. Nos Estados Unidos há mais de 50 milhões de pessoas inscritas nessas redes sociais. Enquanto o bundalelê do AdultFriendFinder está entre os 250 websites mais acessados do mundo, o Match.com está entre os cem primeiros e o eHarmony alega proporcionar mais de 500 casamentos por dia.

Por mais que o algoritmo seja prático, baseado em pesquisas, bem-intencionado e com um altíssimo teor de satisfação entre seus usuários, não se pode negar que haja nele um componente assustador.

Afinal de contas, o simples fato de reunir milhões de pessoas de acordo com um critério único transpira, involuntariamente, a eugenia.

ANDRÉ CONTI

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