sábado, 10 de março de 2012



11 de março de 2012 | N° 17005
TEMA PARA DEBATE - Madgéli Frantz Machado*


Mulheres e violência doméstica

O longo período de lutas pelo reconhecimento dos direitos e da garantia de proteção das mulheres em situação de violência doméstica foi coroado com a edição da Lei Maria da Penha, em agosto de 2006. Já se passaram quase seis anos e a luta continua. Hoje, pela efetivação desses direitos e, principalmente, pela concretização de políticas públicas de proteção às vítimas de violência doméstica e familiar.

A violência doméstica não atinge apenas a mulher. Atinge a família como um todo: filhos, pais, irmãos, avós. Atinge também os vizinhos, que, sem querer, tornam-se espectadores ou ouvintes de cenas diárias e cruéis de violência.

Atinge os amigos, que desesperadamente tentam livrar os seus entes queridos daquele ciclo interminável de violência, e que os acalentam nos momentos de dor e de sofrimento. E atinge, também, o agressor que, na maioria das vezes, por conta da violência infligida, é afastado da família, do convívio com os filhos, do emprego e até mesmo dos amigos.

A família, então, núcleo básico da nossa sociedade, vê-se em destroços e, de maneira urgente, deve ser reconstruída. E, nesse momento, será útil o Direito Penal, ou tão somente este? Evidentemente que não.

É necessária uma política de ações afirmativas que, de fato, ampare as mulheres vítimas de violência, assegurando-lhes a assistência integral, extensiva à família, nos exatos termos do que dispõe a Constituição Federal em seu art. 226, § 8º.

Caso contrário, nenhum efeito surtirá, por exemplo, recente e por muitos festejada decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, que entendeu que, nos casos de lesão corporal leve, a ação penal é pública incondicionada, ou seja, não é necessária a manifestação da vítima para o início da ação penal, e a vítima também não poderá renunciar ou desistir da ação.

Isso porque se estará sujeitando a mulher a processar o seu agressor, mesmo que ela não queira (ou que não seja mais necessário porque ela já resolveu o seu conflito com as ações até então efetivadas).

E, de outra parte, o próprio Estado, através do Poder Executivo, não lhe oferece nenhuma condição efetiva para que ela se livre, definitivamente, da situa- ção de violência, submissão e dependência. Pois, pergunto: Onde estão as oportunidades de imediata inclusão dessa mulher no mercado de trabalho? De inclusão em cursos profissionalizantes?

De acesso à saúde, tratamento e internação para desintoxicação, tratamento psiquiá- trico e psicológico? De acesso a creches públicas para deixar seus filhos enquanto estuda ou trabalha? De obter um lar, ou teto, que seja, para abrigar a sua família?

O Centro de Referência da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar, em Porto Alegre, ainda não é uma realidade. Urge que o Poder Executivo definitivamente abra as suas portas às mulheres que clamam por acolhimento, proteção, tratamento e efetivação do sonho de viver uma vida digna, sem violência.

De nada adianta estabelecermos novas regras penais para obter a punição do agressor se a vítima não estiver plenamente amparada por um serviço que, de imediato, prepare-a para assumir uma nova postura, e proporcionar-lhe (para si e para a família) novas condições e novas expectativas de vida, sob pena de ela não se sentir encorajada para levar a sua questão até o fim.

E, neste caso, chegará em juízo e não fornecerá a prova indispensável para levar o agressor à condenação. Irá se calar. Ou, então, irá dizer: “Fui eu que me botei nele, doutora...”. E todo o trabalho será em vão...

Portanto, façamos cada um a nossa parte e, enfim, quebraremos o ciclo da violência!

*Juíza de Direito, do Juizado da Violência Doméstica e Familiar de Porto Alegre

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