Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 24 de novembro de 2007
25 de novembro de 2007
N° 15429 - Luis Fernando Verissimo
Apoteoses
Todos descreveram os momentos mais incríveis de suas vidas. Mas nada se comparava à apoteose da Thaís
A idéia era cada um descrever o seu melhor momento. O ponto mais alto de sua vida, diferente de tudo o que viera antes e de tudo o que viria depois. Sua apoteose pessoal.
Um contou que seu melhor momento fora terminar um elefante de argila numa aula de trabalhos manuais. Lembra trabalhos manuais? Tinha sete ou oito anos.
O elefante de argila ficara bom. Feito de memória, até que ficara muito bom. Nada na vida o deixara tão contente como aquele elefante de argila.
A Bela contou: "Foi a primeira vez que acertei um pudim. Minha mãe vivia dizendo que eu não acertava o pudim porque era muito nervosa. Fazia tudo certo, não errava nos ingredientes, não errava na mistura, mas de alguma maneira meu nervosismo se transmitia ao pudim e o pudim desandava.
O pudim também ficava nervoso. No dia em que acertei o pudim tive uma crise de choro. Saí da cozinha para não influenciar o pudim, que poderia ter uma recaída.
Mas, na mesa, quando minha mãe disse O pudim é da Bela e todo mundo aplaudiu, meu Deus do céu. Nunca mais senti a mesma coisa. Nem quando nasceram os gêmeos. Nunca mais."
Já outra disse que nada se igualara a ter o primeiro filho. "Olha aí, até hoje não posso contar que me emociono. E o engraçado é que foi um sentimento extremamente egoísta. Me enterneci por mim mesma.
Eu olhava aquela coisinha, tão bem feitinha, e me achava formidável, até ficava com ciúmes quando só elogiavam o bebê. Eu é que queria festa. Queria dizer fui eu, fui eu, ele é apenas o produto da minha genialidade. No meu marido, coitado, eu nem pensava.
Ele não tinha nada a ver com aquilo. E eu não o deixei acompanhar o parto. Sempre considerei pai acompanhando parto uma espécie de penetra. Alguém querendo participar de uma glória que não merece, como prefeito inaugurando obra da administração anterior.
A glória era só minha. Aliás, em todo o processo de procriação, parto, essas coisas, o homem é um penetra. Sem duplo sentido, claro. O primeiro filho. Sem dúvida nenhuma, o primeiro filho... Depois o desgraçado cresceu e foi aquilo que todo o mundo sabe."
Para outro, foi a formatura o maior momento. Outro, o primeiro caso. Não, não o primeiro caso, assim, caso. O primeiro caso como advogado! Outro contou que seu maior momento fora a vez em que acertara uma bicicleta no futebol. "Nunca tinha tentado uma bicicleta antes, mas do jeito que a bola veio não havia alternativa.
Fechei os olhos e fiz o que tinha visto outros fazerem. Atirei-me para trás, pedalei no ar e senti o segundo pé acertar a bola. Quando me levantei do chão, vi que a bola tinha entrado no ângulo da goleira. Não havia platéia para aplaudir, era um jogo de praia.
O goleiro adversário, ressentido, só disse Sorte. Meus companheiros de time também não se entusiasmaram muito com o lance. Não me conheciam, eu tinha sido escalado porque estava passando e faltava jogador. Já me resignara à comemoração solitária do meu feito, pelo resto da vida, quando vi o garoto que vendia picolé na praia olhando pra mim e sorrindo.
O garoto estava sentado na sua caixa de isopor e quando me viu olhando pra ele levantou o dedão num sinal de positivo. Minha bicicleta tinha sido vista e aprovada.
A única posteridade do meu lance é aquele vendedor de picolé, que já deve ter se esquecido. Mas eu não esqueci. Nunca me orgulhei tanto de alguma coisa como daquela bicicleta. Bem no ângulo."
Em seguida foi a vez da Thaís, e a Thaís arrasou. Contou como foi sua apoteose. A justificativa da sua existência, o prêmio final por todo o seu empenho em viver com bom gosto e gastar o dinheiro do Gegê com inteligência.
Foi a vez em que entrou no café do Hotel Carlyle, de Nova York, no meio do show do Bobby Short, acompanhada por uns brasileiros que nunca tinham conseguido entrar no lugar, e, quando a viu, o Bobby exclamou "Thaís"!
Para completar a humilhação, Thais contou que Bobby Short pronunciou o "agá" do seu nome.
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