quinta-feira, 29 de novembro de 2007



29 de novembro de 2007
N° 15433 - Paulo Sant'ana


O apocalipse do trânsito

As concessionárias gaúchas de carros venderam 100 mil veículos este ano, até agora.

Isto quer dizer que as concessionárias brasileiras já venderam 2 milhões e 100 mil carros até novembro.

Eu levo 30 minutos para vir do Iguatemi, onde moro, para o Morro Santa Teresa, na televisão. Este tempo, há poucos anos, se levava para vir de Novo Hamburgo a Porto Alegre.

O trânsito engarrafado de Porto Alegre está tão irritante, que há pessoas que cortam trajetos passando por dentro dos shoppings, ainda que tenham de tirar um tíquete na entrada e entregá-lo gratuitamente na saída. Sai mais em conta no tempo do que permanecerem no engarrafamento.

Dois shoppings que encurtam o trajeto são o Total e o Zaffari da Bordini.

A impressão que dão as avenidas de Porto Alegre é de que há mais carros na cidade do que habitantes.

Vocês acham que estou brincando? Pois saibam que esses dias li um anúncio no ZH Classificados de venda de um apartamento de um quarto com duas vagas na garagem.

Em Porto Alegre, há edifícios, que já foram ou estão sendo entregues aos novos moradores, que têm o triplo de vagas na garagem do que o número de apartamentos. E muito em breve as áreas de estacionamento dos edifícios terão o dobro do espaço reservado aos apartamentos.

Tanto no Hospital São Lucas da PUC quanto no Hospital Moinhos de Vento, há mais carros estacionados nas garagens do que a soma de médicos e pacientes.

Na marcha que vai, já sei como será o trânsito nas vias de Porto Alegre e das grandes cidades nas próximas décadas: haverá, como acontece com o sistema de saúde, avenidas destinadas aos motoristas do SUS e outras avenidas, as mais rápidas, para os motoristas da Golden Cross, que pagarão pedágio altíssimo para fugirem do sistema gratuito do tráfego.

E para sair com o seu carro às ruas por um só dia, os motoristas do sistema gratuito terão de inscrever-se com uma semana de antecedência nas filas, como acontece nas filas de cirurgia do SUS.

Não sei qual será a solução para este Apocalipse do trânsito que já começamos a sofrer e vislumbrar.

A idéia de que num dia só podem trafegar as placas de final ímpar e no dia seguinte as de final par é pífia: ela é fraudada ao natural pelas pessoas que vão ter um carro de final ímpar e outro de final par.

E à medida que forem afunilando a restrição, é tão grande a facilidade para comprar carros a crédito atualmente, que se na segunda-feira só puderem trafegar os carros de placas com final 1, na terça-feira com final 2, na quarta-feira com final 3 e assim por diante, cada pessoa vai comprar carros com todas as 10 unidades finais das placas.

Já há e haverá cada vez mais casos de famílias que têm mais carros do que membros, pais que têm mais carros do que filhos.

Antigamente, quando um filho se formava na universidade, os pais davam-lhe uma caneta de presente.

Hoje, dão um carro zero. O segundo, porque o primeiro já tinha sido ganho quando completou a maioridade.

Está um inferno dirigir em Porto Alegre e cada vez mais são lançados carros zero no mercado. No meu edifício, há duas empregadas domésticas que têm carros populares.

E esses dias, na sinaleira, um mendigo me pediu dois reais dirigindo um Corsa.

A situação está tão braba, que nas sinaleiras tem motorista pedindo esmola pra pedestre.

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