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quinta-feira, 22 de novembro de 2007
22 de novembro de 2007
N° 15426 - Luiz Pilla Vares
O rei e o índio
Nunca um bate-boca rendeu tanto noticiário como este entre o rei Juan Carlos, da Espanha, e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez.
Mas é evidente que, por trás dessa repercussão, está a tentativa deliberada de desqualificar o presidente Chávez, que chamou o ex-primeiro-ministro espanhol, José María Aznar, de fascista. Chávez não estava longe da verdade, já que Aznar é ligado a uma das organizações mais conservadoras da Europa, a Opus Dei.
O despropositado no fato do bate-boca foi a audácia do rei espanhol em querer mandar o líder venezuelano calar a boca, como se fosse um Carlos V ou um Filipe II e como se a velha monarquia espanhola ainda fosse dona da América Latina.
O rei parece não se dar conta que séculos transcorreram e a América hoje é republicana, inteiramente republicana, ainda mais agora, quando os povos indígenas, quase eliminados fisicamente pelo colonialismo espanhol, retomam o seu lugar na história, sem canhões, no voto e nos movimentos sociais.
O mestiço Chávez, muito mais para índio do que para branco, é fruto dessa revanche. É verdade que ele não dá muita bola para a linguagem diplomática e não tem papas na língua.
Se é para chamar o presidente Bush de diabo, chama. Se é para chamar Aznar de fascista, chama. E não se achincalha diante do rei, aliás um rei que recebeu a coroa do ditador Francisco Franco.
Felizmente, há muitos brasileiros que não se deslumbram com a arrogância e a prepotência de Juan Carlos. Mauro Santayna, do Jornal do Brasil, é um deles: "O presidente Hugo Chávez é descuidado e franco no que fala.
Usa em sua retórica antiimperialista, metáforas quase divertidas, como chamar Bush de diabo. Mas não exagerou ao qualificar o ex-primeiro-ministro espanhol José María Aznar de fascista. Aznar, produto típico da Opus Dei, que se reorganiza com novo alento na Espanha, sempre tratou a América Latina com desdém".
Em compensação, um prestigiado colunista aqui mesmo de Porto Alegre saiu em defesa do rei e qualificou Chávez de "bufão". O cronista escreve bem quando trata de gostosos textos sobre o passado da capital gaúcha e de nossa imprensa.
Mas foi um desastre quando se meteu no bate-boca do rei com Chávez. E, ainda pior, no dia seguinte, para glorificar o rei, deu o exemplo de Alcazar, durante a Guerra Civil Espanhola dos anos 30. Afirmou que Alcazar era a Espanha.
Mas não disse que os defensores de Alcazar eram fascistas, sequazes de Franco, que venceu a guerra contra os republicanos, graças ao auxílio de Hitler e Mussolini. Nem lembrou que a Espanha foi também Guernica.
Este rei arrogante que trata as lideranças da América como se fosse ainda dono de nosso espaço teve de encontrar pela frente a altivez de dois latino-americanos: Chávez da Venezuela, que ousou desafiar abertamente o império norte-americano, e Ortega, sandinista histórico da Nicarágua.
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