01 DE OUTUBRO DE 2022
BRUNA LOMBARDI
A CRIANÇA QUE TE HABITA
Uma amiga querida, a Miriam, postou recentemente um texto que me doeu, sobre a menina triste que ela foi. Lembra uma infância de brigas, gritos e surras. Uma criança diante da violência. Uma casa de ódio e gritos que a assustaram para o resto da vida. Uma criança que cresceu com muito medo, escondida de pavor, solitária e invisível, como ela escreveu. Que nunca conseguiu se sentir amada ou protegida, nem livre e nem segura, quando todas as meninas em volta pareciam ser. Pareciam ter tudo o que ela nunca teria.
Como se pode crescer com esperança sentindo tamanha rejeição? Como sobreviver com tanta angústia e medo num mundo que é só ameaça? Como essa menina abandonada conseguiu superar, se transformar e achar seu rumo? Ela abriu seu caminho e se tornou uma mulher maravilhosa, com um coração generoso e um trabalho sobre temas relevantes que ajudam a todos.
A criança continua nela. Deve despertar às vezes e ainda provocar momentos de aflição, dor, insegurança. Trazer sentimentos que machucam e teimam em se reacender, como brasas numa lareira. Mas nesse mesmo fogo está a chama de viver, o entusiasmo, o estímulo que reinventamos todos os dias pra encarar a vida.
Sempre teremos incertezas, tempos difíceis. Sustos e surpresas. Lágrimas e euforia. Medos que ainda permanecem e minam nossos passos. Não sabemos onde vai a estrada e vamos caminhando, escolhendo o trajeto, desviando de obstáculos, seguindo sonhos. Mesmo com o vento contra e adversidades, continuamos.
Não podemos mudar o passado, mas podemos construir o presente passo a passo. Uma família pode ser um núcleo de amor e proteção, mas também pode ser um ambiente tóxico e nocivo que marca vidas. A gente se apaixona, junta, casa, tem filhos e de repente, sem se dar conta, se torna responsável pela saúde mental, psíquica e emocional das pessoas desse núcleo.
Muita gente acredita que a compensação financeira substitui presença e afeto, mas sabemos que não. Muita gente reage no impulso da raiva, na explosão diante do problema, sem perceber a consequência que está causando. A energia ruim, o desamor, o ódio, a indiferença, trazem efeitos duros, dores profundas, traumas. A inconsequência gera efeitos indeléveis.
Tudo o que fazemos e dizemos tem um forte poder. E pra não repetir a história que nos fez mal, precisamos reinventar o amor. Ressignificar o amor para que nos aponte a direção e ilumine as trevas. Que ajude a encontrar os becos escuros onde essa criança assustada continua dentro de nós.
Vamos pegar essa criança pela mão, com muito cuidado. Cuidar dela. Abraçar e dizer que ela pode confiar. A menina que você foi não está mais abandonada porque a mulher que você é, com sua consciência, sua sabedoria, seu aprendizado, agora cuida dessa criança.
A pessoa que você se tornou é capaz de curar esse coração machucado. E você pode agradecer essa criança por tudo o que ela passou e segurou, permitindo que você se tornasse a pessoa que você é. Respire fundo e ame a criança que te habita.
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