04 DE JUNHO DE 2022
FLÁVIO TAVARES
DUAS MORTES
Ninguém pode fugir à morte. Mas é na morte que a vida (ou o que fomos em vida) se ressalta. Dias atrás, David Coimbra nos deixou, aos 60 anos de idade, após lutar estoicamente contra o câncer por um decênio.
Não repetirei o que já se disse sobre ele, mas é impossível silenciar. Em cartas ao jornal, os leitores deram o veredito, pois são os únicos juízes do que publicamos. O legado que David nos deixa é, mais do que tudo, a perseverança, a alegria e a bondade que fizeram dele um jornalista e escritor que encantava até quando descrevia o corriqueiro.
Anos atrás, David fez a apresentação do meu livro "1961 - O golpe derrotado", na sessão de autógrafos do lançamento e falou sobre o movimento da Legalidade - anterior ao seu nascimento - com profundo conhecimento. Seu estilo era encarar com seriedade o que fosse. Por isso, nos fará falta e sua perda nos transforma em órfãos.
Ao norte, em Sergipe, outra morte chama atenção. O Brasil não tem pena de morte. Nenhum juiz pode sentenciar à morte sequer o criminoso mais perverso, mesmo em minucioso processo que prove a sanha da perversão.
O "direito de matar" parece reservado à polícia, como na execução de Genivaldo de Jesus Santos pela Polícia Rodoviária Federal. Viu-se a cena pela TV - algemado e posto no porta-malas da viatura policial, ele esperneia para se livrar do suplício, pois os policiais acionam o gás lá contido. Logo, morre asfixiado, como se as câmaras de gás dos campos de extermínio nazistas se reimplantassem no Brasil.
A vítima foi interceptada por trafegar sem capacete em motocicleta. Por não se autoproteger, foi morto pela polícia?
Dias após, o presidente da República tampouco usou capacete numa "motociata" em Goiás. Mas a PRF nem sequer lhe ofereceu capacete de proteção.
Os absurdos crescem, e Bolsonaro pediu que não houvesse "excesso de justiça" no julgamento do caso e da operação policial que matou 23 pessoas na Vila Cruzeiro, no Rio. "Excesso de justiça" será fazer justiça?
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