terça-feira, 12 de outubro de 2021


12 DE OUTUBRO DE 2021
CARLOS GERBASE

Os filmes pensam Enéas

Economista, psicanalista e crítico de cinema - não sei se esta é a melhor ordem, mas isso pouco interessa num autor transdisciplinar -, Enéas de Souza já tinha colocado seu nome na história do pensamento cinematográfico gaúcho com Trajetórias do Cinema Moderno, de 1974. De lá para cá, continuou escrevendo ensaios, alguns deles publicados em Cinema: O Divã e a Tela, de 2011, em parceria com Robson Pereira. Para nossa sorte, Enéas está de volta com Os Filmes Pensam o Mundo, coletânea em que, além de visitar criticamente obras de grandes cineastas, nos oferece um texto inédito de pequena extensão (30 páginas), mas bem grande em sua profundidade analítica, com o título de Cinema É Energia, Ficção e Pensar.

Sempre é um risco resumir o cerne de um ensaio de base estética, mas vamos lá. Primeiro transcrevo o seu início: "O ponto central da análise de cinema é o pensamento em imagens do cineasta. E o diretor trabalha o seu pensar no interior da ficção de um filme. Dito claramente: cinema é ficção e é pensar. Só que a ficção é forma primeira da apresentação do filme, exala emoção dinâmica". A partir daí, Enéas, de forma didática, mas nunca simplificadora, mostra como esse primeiro estágio de um filme (sua narrativa formal, que estabelece a base emocional do enredo) leva a mais duas etapas, nem sempre detectadas pelo público: o modo como o cineasta compreende o seu ofício e, finalmente, como ele pensa a relação de seu ofício com o homem e o mundo.

É neste terceiro momento que os filmes (ou pelo menos alguns filmes) alcançam seus momentos mais sublimes, pois revelam o potencial de captar o espírito da época em que foram realizados e o modo como o diretor se insere em seu contexto histórico. Em outras palavras: cabe ao analista trabalhar primeiro junto às emoções do espectador (sendo também um espectador), compreendendo como a trama e os personagens estão articulados, para depois chegar ao pensamento estético do diretor-autor e, finalmente, à relação do filme com seu tempo e suas circunstâncias de realização. Enéas, assim, propõe uma trajetória reflexiva sólida, bem distante de pensamentos reducionistas e apressados, que, em vez de partir da obra, baseiam-se em pressupostos ou intenções do próprio crítico.

CARLOS GERBASE

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