terça-feira, 31 de março de 2009



31 de março de 2009
N° 15924 - MOACYR SCLIAR


Em defesa do neochurrasco

Se fôssemos paranoicos (e um pouco nós somos) diríamos que o Archives of Internal Medicine, publicação médica norte-americana, tem alguma coisa contra os gaúchos.

A revista acaba de publicar um vasto estudo, realizado por pesquisadores do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, abrangendo mais de meio milhão de pessoas acompanhadas desde 1995. Os resultados mostram que o consumo de carne vermelha e carnes processadas (presunto, salsichas, bacon) traduz-se em pequeno aumento (modest increases) do risco de mortalidade por doenças cardiovasculares e câncer.

O trabalho teve repercussão, inclusive por aqui; médicos brasileiros que comentaram a pesquisa citaram o Rio Grande do Sul como exemplo dessa correlação. Assim, no Amapá, a incidência anual do câncer de intestino é de 1,51 caso por 100 mil habitantes, enquanto no Rio Grande do Sul a incidência anual é de 28,5 casos por 100 mil habitantes.

Nos Estados Unidos, o Centro pela Liberdade do Consumidor, que obviamente quer ver as pessoas comendo mais carne (e outros produtos) tratou de minimizar os achados do estudo, dizendo que fatores ligados ao estilo de vida poderiam explicar os resultados. Devemos fazer a mesma coisa?

Não. O Archives of Internal Medicine é uma publicação respeitável; o estudo é sério, e levou em consideração possíveis causas de distorção. Mais do que isto, estudos similares apontam na mesma direção.

E faz sentido associar o consumo da carne (por causa da gordura e também do sal) com doença, principalmente carne assada: as altas temperaturas resultam na produção de substâncias cancerígenas. A pergunta é: o que a gente faz com esta informação, sobretudo numa região em que o churrasco faz parte da história e da cultura?

Em primeiro lugar, temos de aprender com as lições da própria história. O RS sempre foi carnívoro, o que era apenas natural, dada a facilidade de criação de gado no pampa.

A carne é uma abundante fonte de proteína, e isto certamente evitou os problemas de desnutrição comuns em outras regiões. Mas o predomínio da carne na alimentação (e nas churrascarias) aos poucos foi cedendo à diversidade, e neste sentido a imigração, sobretudo italiana, representou uma contribuição importante e sábia.

Com o sistema de espeto corrido, as pessoas comem não só carne, mas também saladas (que os antigos gaúchos classificavam como “pasto”), polenta, massa, frango, às vezes peixe (no passado, alimento exclusivo da Semana Santa). Além disso, é possível selecionar carne com menos gordura e usar menos sal.

Porque o churrasco deve, sim, ser preservado. Ele não é apenas uma refeição, é uma forma de convivência entre familiares e amigos, uma ocasião de trocas emocionais que certamente beneficiam a saúde, mesmo que isto não tenha sido quantificado (é mais difícil).

Precisamos criar um neochurrasco, baseado nas constatações da ciência. Criatividade para isto não nos faltará. E pode até, quem sabe, dar origem a um triunfal estudo a ser publicado no Archives of Internal Medicine.

- Culta, dinâmica, inteligente, Sandra Pesavento não deixou apenas uma notável contribuição à historiografia gaúcha e brasileira, deixou uma lição de vida. Sua história agora é parte de nossa história.

- Quem conhecia Marília Gabriela apenas como brilhante apresentadora teve uma bela surpresa ao vê-la na peça Aquela Mulher, de José Eduardo Agualusa, direção de Antônio Fagundes. O São Pedro de dona Eva Sopher aplaudiu-a de pé.

- 31 de março. Viva a democracia.

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