sexta-feira, 20 de março de 2009



20 de março de 2009
N° 15913 - PAULO SANT’ANA


A separação dos poderes

O delegado de polícia Alexandre Vieira não gostou muito de ter perdido para esta coluna a aposta sobre a tipificação do crime cometido pelo pequeno empresário que foi cobrar à mão armada dívida contraída a favor dele contra a Corsan: “Prezado jornalista.

Em razão de matéria veiculada em sua coluna na data de 19/03/09, onde Vossa Senhoria fez referência a minha atividade profissional, sirvo-me do presente para fazer uso do democrático direito de resposta, do qual tenho certeza que será publicada. Sendo assim, informo-lhe que:

As decisões tomadas pelo signatário e pelos delegados de Polícia que compõem esta Divisão de Polícia Judiciária não são norteadas pela repercussão que os órgãos de imprensa dão aos fatos. Estou calejado em tomar decisões no calor dos acontecimentos, pois lá se vão 33 anos e oito meses nesta atividade.

O auto de prisão em flagrante foi apreciado pelo Ministério Público e pelo juiz plantonista, tendo sido homologado.

Com toda vênia, o crime perpetrado era a figura tipificada como extorsão. Não cabe a mim perquirir as políticas criminais adotadas por juízes e tribunais. Sabemos que diversos juízes chamados ‘alternativos’ decidem assim.

Neste caso, um juiz e um promotor tiveram o mesmo entendimento que a polícia e, mais, o juiz decretou a prisão preventiva do acusado. Logo após, outro juiz e outro promotor decidiram contrariamente.

Sorte do acusado.

Hoje prendemos um ladrão de picanha. O autor era funcionário de um hipermercado, tinha o dever de zelar pelas mercadorias. Temos a figura do furto qualificado em razão do abuso de confiança. Foi para o presídio. O juiz manteve a prisão e homologou o flagrante.

Fiquei surpreso com o teu comentário na TV, quando disseste que a Polícia estava correta e que não se tratava de furto famélico.

Quero te dizer que tem alguma coisa me incomodando nesta situação. Enquanto escrevo, descobri que estou raciocinando como o Pablo Sant’Ana. Naquele outro caso, agimos como o Paulo Sant’Ana e tu como o Pablo.

O que me conforta é que o Pablo Sant’Ana erra muito, embora seja bastante humano.

É, caro amigo, estamos na contramão.

Forte abraço do amigo e colega. Saúde e luz para ti. (ass.)Alexandre Vieira, delegado de polícia”.

Outro dia, escrevi que entre todas as artes, a música, a escultura, o canto, a pintura, o cinema, a literatura, o teatro, a que mais me fascinava era a oratória.

Mas há momentos em que, no entanto, a literatura alça voos tão altos quanto a oratória.

Um desses momentos é quando Charles de Montesquieu define a “separação dos poderes”, na sua obra L’Esprit des Lois. Eis um desses momentos:

“...é uma experiência eterna a de que todo homem que tem o poder tende a abusar dele. Ele vai até onde encontra limites. Quem o diria! A própria virtude tem necessidade de limites.

Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposição das coisas, o poder detenha o poder. (...) Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura o poder legislativo está reunido ao poder executivo, não há liberdade, porque se pode temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado façam leis tirânicas para executá-las tiranicamente.

Não há liberdade se o poder de julgar não está separado do poder legislativo e do poder executivo. Se ele estivesse confundido com o poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria legislador.

Se ele estiver confundido com o poder executivo, o juiz poderá ter a força de um opressor.

Tudo estaria perdido se um mesmo homem ou o mesmo corpo de principais, nobres ou do povo, exercessem esses três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar as questões dos particulares (...)”.

Não sei por que me lembrei de Hugo Chávez quando li este texto de Montesquieu.

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