REPIQUE DA INADIMPLÊNCIA
Os níveis elevados de endividamento e inadimplência no país permanecem como um limitador para o crescimento da economia via mercado interno. Quando uma parcela significativa da população tem dificuldade para honrar compromissos ou mesmo não consegue quitá-los, a consequência é que terá pouco ou nenhum recurso sobrando para consumir além do essencial à sobrevivência. O quadro se mostra ainda mais delicado quando sequer as contas básicas são pagas. É necessário seguir atento à evolução do cenário nos próximos meses.
Reportagem de Anderson Aires publicada ontem em Zero Hora ilustra essa situação. É um recorte para o Rio Grande do Sul, mas por certo o panorama nacional não é muito diverso. Dados da Serasa apontam que, em agosto no Estado, a participação de dívidas oriundas de despesas comuns a qualquer residência, como energia, água, gás e serviços de telecomunicação, chegou a 26,4% do total de débitos em aberto. Ou seja, ampliou a fatia na comparação com as demais classes de contas. É o maior percentual já observado pela série histórica da empresa, iniciada em 2019.
As estatísticas mais amplas também preocupam. O número total de gaúchos inadimplentes voltou a subir em agosto, após dois meses de queda. São 3,547 milhões de pessoas com dívidas atrasadas. O mesmo aconteceu no restante do país. Após queda no indicador em junho e julho, mais 320 mil brasileiros entraram para a massa de devedores com compromissos vencidos em aberto. São 71,74 milhões de cidadãos inadimplentes, mais de um terço da população do Brasil.
O panorama atual é reflexo de uma conjunção de fatores. Começa com as dificuldades econômicas criadas pela pandemia e passa pela escalada da inflação e da taxa de juro. O quadro conjuntural, no entanto, já é outro. A atividade vem apresentando surpresas positivas, o desemprego está em queda, a renda vem subindo, os índices de preços estão acomodados após um recuo significativo e o Banco Central começou um ciclo de corte de juro. São fatores que deveriam contribuir para o arrefecimento da inadimplência. Os números mais recentes, porém, mostram um alarmante repique da incapacidade de honrar as contas.
Em paralelo, o governo federal também implementou o programa Desenrola Brasil, voltado à renegociação de dívidas e para limpar o nome de pessoas físicas. A iniciativa entrou na semana passada na segunda fase. Foram realizados leilões de dívidas, em que os credores ofereceram descontos. Faturas básicas, como energia e água, também foram incluídas no certame, direcionado para solucionar pendências de cidadãos com renda de até dois salários mínimos ou inscritos no Cadastro Único. Conforme o Ministério da Fazenda, graças aos descontos concedidos, dívidas de R$ 151 bilhões se transformaram em R$ 25 bilhões a serem pagos pelos beneficiados.
Será importante, agora, avaliar os próximos meses para compreender qual deve ser a trajetória dos números de inadimplência. Um dos pontos a ser observado é se novas dívidas com risco de virar inadimplência estão sendo criadas. A saúde financeira das famílias também depende, em parte, de uma melhor educação financeira. De outro lado, é preciso que o governo tenha extremo cuidado para manter a economia crescendo, com reflexos no emprego e na renda, mas com atenção especial para a responsabilidade fiscal, que ao fim dita a dinâmica de fatores como inflação e taxas de juros praticadas no mercado.
OPINIÃO DA RBS
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