30 DE MARÇO DE 2020
DAVID COIMBRA
Eles soltos e nós presos
Minha mãe está como eu, você e o planeta inteiro: está perplexa com tudo isso que vem acontecendo. Ontem, ela descobriu que a Justiça gaúcha libertou 3,4 mil presos e me ligou:
- David, eles estão soltando os presos e prendendo a gente.
Fiquei mudo ao telefone. Era uma lógica irretorquível. Depois, comecei a imaginar esses presos soltos. Ou, melhor, esses ex-presos. Eles saíram da cadeia porque a Justiça temia que fossem contaminados pelo coronavírus. Faz sentido. Sabemos bem que os apenados se amontoam nas celas no Brasil. Se um contrair uma doença altamente contagiosa, como a covid-19, todos contraem. Assim, eles ganharam a liberdade para não adoecer. Com o que, suponho que irão para suas casas e permanecerão em severo confinamento durante o tempo que as autoridades determinarem.
É isso? Tomara que sim.
Se não for isso, se eles retomarem suas atividades, assaltando pessoas, por exemplo, colocarão a eles próprios e à comunidade em risco. Afinal, um bandido, quando assalta, muitas vezes entra em contato próximo com a vítima, quase íntimo. É bastante comum o assaltado se surpreender com a abordagem do assaltante e vacilar no cumprimento das ordens. O assaltante, desta forma, em geral dá uma tapona no lado da orelha do assaltado, como advertência. Então, questiono: essa mão, que desferiu o tapa, foi higienizada? Como poderemos ter certeza de que o nosso bandido não está com corona nas mãos?
Pior é o sequestro relâmpago, porque, nessa modalidade, a vítima e os bandidos rodam às vezes horas pela cidade, a fim de sacar dinheiro de caixas eletrônicos, abastecer o carro e tudo mais. Outro dia, vi um filme com a nossa amada Marina Ruy Barbosa com o título, justamente, de Sequestro Relâmpago. É baseado na história real de uma moça que foi sequestrada em São Paulo. No filme, Marininha passa a noite com os dois bandidos e chega até a beber cerveja com eles. Se um dos três tivesse corona, passaria para os outros. Ou seja: ser sequestrado, ainda que "relampagamente", não é seguro.
Será que a Justiça pensou nessas inquietantes questões? Na hora de soltar um preso, o juiz deveria fazer algumas advertências rigorosas:
- Se o senhor for assaltar alguém, por favor, mantenha-se a dois metros de distância, que é o que recomendam as autoridades médicas. - Se for apenas furtar, faça-o de luvas, para não contaminar as superfícies em que tocar, como, por exemplo, a gaveta ou o cofre em que está guardado o dinheiro.
- Outra coisa. Muito importante! Se tiver de encostar o cano da arma na vítima, por favor, limpe antes o revólver com álcool 70 graus.
- Finalmente, não deixe a vítima gritar. Gritos podem expelir gotículas que colocariam sua saúde em risco. Espero que a Justiça tenha tomado essas precauções. Tudo pela saúde pública.
DAVID COIMBRA
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