27 DE MARÇO DE 2020
CORONAVÍRUS
Leite consolida protagonismo entre governadores na crise
Na abertura da videoconferência entre governadores, quarta-feira à noite, que selou o isolamento de Jair Bolsonaro, Eduardo Leite foi chamado para redigir a carta final do encontro. Consenso entre os demais mandatários, recebeu a assistência do pernambucano Paulo Câmara (PSB) e, ao final da audiência, entregou um documento pedindo "serenidade" ao presidente.
Aos 35 anos recém feitos, Leite tem consolidado seu protagonismo entre os colegas em meio à crise do coronavírus. Um dos personagens mais ativos no Fórum dos Governadores, foi um dos primeiros a impor medidas restritivas para combater a pandemia e decidiu mantê-las mesmo após o apelo do presidente. Porém, na contramão do paulista João Doria (PSDB), do fluminense Wilson Witzel (PSC) e do goiano Ronaldo Caiado (DEM), tem evitado o confronto direto com Bolsonaro.
- Ele consegue dissociar qualquer questão política e ideológica do atual momento. Entende que o inimigo é a covid-19 e que, contra ela, temos de nos unir. Para Leite, não é hora de rupturas institucionais - diz o vice-governador, Ranolfo Vieira Júnior.
Diante da pandemia, Leite cumprimentou Bolsonaro na busca por recursos aos Estados. Na terça-feira à tarde, participou de encontro remoto com o presidente e os governadores de Santa Catarina e Paraná, celebrando o tom sóbrio da conversa. "Tivemos uma reunião positiva hoje com Jair Bolsonaro e ministros para estabelecer a coordenação de esforços no enfrentamento do coronavírus", escreveu no Twitter.
Na audiência, coube ao gaúcho alertar o Palácio do Planalto que a anunciada suspensão do pagamento da dívida com a União é insuficiente para atenuar o impacto da crise nos Estados. Leite lembrou que Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás já estão livres do repasse e pediu que a União assuma débitos estaduais com organismos internacionais.
À noite, contudo, Leite modulou o discurso. Reagiu nas redes sociais após o polêmico pronunciamento de Bolsonaro em rede nacional, mas sem mencioná-lo diretamente. "É urgente encontrar alternativa ao confinamento. Mas não se faz isso com ataques à ciência e à cautela médica mundialmente estabelecidas. Não deixamos de olhar economia e empregos. Mas não assistiremos inertes a uma doença se alastrar. Protege-se: 1) a vida; 2) os empregos. Nesta ordem", publicou.
Conciliação
A interlocutores, Leite se disse surpreso pelo tom de enfrentamento adotado por Bolsonaro, dissociado das recomendações internacionais, mas descartou o embate direcionado. Para analistas, seu posicionamento está relacionado ao seu perfil sereno e conciliador - auxiliares mencionam nunca tê- lo visto alterar a voz - associado a um cálculo político. O governador tem buscado se projetar como liderança de centro, demandada no cenário político polarizado do país.
- Ele combina muito bem o cuidado técnico e a leitura política na tomada de decisões. Seria uma enorme precipitação se colocar como um contendor nacional neste momento - analisa o cientista político Fernando Schüler, professor do Insper.
O fato de Bolsonaro nunca tê- lo atacado diretamente também contribui para a crítica mais equilibrada. Potenciais adversários na disputa pela Presidência em 2022, Doria e Witzel aparecem na mira de Bolsonaro com frequência, antes mesmo da crise política instalada diante da pandemia. Já Caiado tomou uma decisão baseado em seu currículo de médico.
- Leite está fora do radar político de Bolsonaro, e é bom que assim esteja. Ele pretende ser uma alternativa de centro, não mais um elemento de confronto - acrescenta Schüler.
O cientista político Rodrigo González, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), concorda. Segundo ele, o governador tem aparecido como um político moderado e com capacidade de construir alianças. González afirma que a postura parece adequada para a governança, mas que Leite poderá ser obrigado a subir o tom se quiser ser notado pelo eleitor no futuro:
- Não é de interesse dele um confronto direto. Isso já está sendo feito por outros governadores, e mais uma briga com Bolsonaro não acrescentaria muito em termos de mídia. Mas ele corre o risco de não ser percebido pela população se não chamar a atenção.
DÉBORA ELY
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