14 DE MARÇO DE 2020
+ ECONOMIA
Medidas para Brasil precisam ter força
Teria sido melhor esperar para apresentar todas juntas as medidas do governo federal para amenizar o impacto econômico do coronavírus no Brasil. O anúncio, na quinta-feira à noite, de antecipação de pagamento de metade do 13º salário para aposentados do INSS deu ideia de que o Ministério da Economia não estava preparado para enfrentar uma crise do tamanho que já se apresenta. Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) diagnosticou:
- Guedes não tinha uma coisa organizada ou não quis falar.
Dias antes, o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega havia afirmado à coluna que via o governo "paralisado" diante da crise. Ficou pior ainda porque, pouco antes, o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) havia anunciado um programa de liquidez - rápida transformação de aplicações em dinheiro - de US$ 5 trilhões. Isso equivale a um quarto de todo o PIB americano e a mais de duas vezes todo o PIB anual do Brasil (segundo o Banco Mundial, US$ 1,8 trilhão em 2018). Foi essa dose cavalar que produziu a sexta-feira de trégua no mercado financeiro mundial. Em tempestades como a que abate bolsas e empresas nestes dias, melhor sacar alto, ou nem sacar.
Isso ficou tão evidente que, pouco depois de Maia se manifestar, o ministro Paulo Guedes se apressou em avisar que há mais de 20 medidas. Disse que algumas seriam anunciadas em seguida, mas até as 19h de sexta-feira, nada havia sido comunicado. O que se espera das ações:
- Alívio tributário e financiamento facilitado aos setores mais atingidos, como o de empresas aéreas.
- Usar recursos congelados no Banco Central como fonte desses financiamentos para permitir maior prazo de carência (tempo entre a obtenção do dinheiro e o inicio do pagamento).
- Reforço na renda da população, especialmente de quem depende de trabalho temporário.
É preciso "salvar a situação"
No meio empresarial, há pressa para conhecer as medidas do governo brasileiro não porque os negócios estejam correndo risco imediato, mas porque está difícil prever o futuro, explica o presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB), José Augustro Castro.
- Ainda não está mal, mas pode ficar. É papel do governo fazer algo para amenizar o impacto da crise. Pelo cenário que se vislumbra, dentro e fora do país, nada disso acaba amanhã, vai levar ao menos um ou dois meses.
Seriam recursos para "salvar a situação", não para aumentar os lucros, argumenta:
- É para garantir que a economia resista por um ou dois meses.
Um dos pedidos mais frequentes dos empresários, diz Castro, é a liberação de financiamento para pequenas e médias empresas com período maior de carência.
- O número de casos vai crescer no Brasil, é possível que medidas de isolamento tenham de ser adotadas. Isso reduz o nível de atividade, pode haver risco de demissão de pessoal, o que agrava uma situação que já não vinha boa. Precisamos ao menos manter a atividade atual.
Para dar ideia do tamanho da incerteza, explica, até entre os exportadores há informações, desencontradas sobre disponibilidade de navios para transporte de mercadorias.
- Sabemos que haverá atraso, o que vai gerar custo e alguém vai ter de bancar. Isso envolve negociação com os armadores. Mas ameaças de aumento do frete não se sustentam - diz.
Alta é parte do problema
Altas como a de sexta-feira na bolsa de valores não significam fim da turbulência. Ao contrário, afirma o ex-secretário da Fazenda Aod Cunha, ajudam a caracterizar os fins de ciclo nos mercados. Quem acompanha as palestras de Aod sabe que ele costuma apontar, há ao menos dois anos, que o mundo vivia o ciclo de alta mais longo dos últimos cem anos, portanto passível de correção.
- As maiores quedas diárias da história ocorrem nesses períodos, mas as maiores altas também. Quando os ativos ficam caros, tenta-se argumentar que vai durar por tecnologia, produtividade ou inovação, mas o fato é que o ciclo acaba.
Nas crises de 1991 e 1999, lembra, a bolsa nacional chegou a ter altas de 33%.
O fato de o fim do ciclo ter sido provocado por uma epidemia, pondera Aod, é preocupante. Por um lado, caso os mercados estivessem instáveis apenas pela covid-19, poderia haver queda rápida seguida por reação igualmente veloz.
- Há sinais de que não é só isso, porque a economia global estava em desaceleração antes do coronavírus - avalia Aod.
Além da incerteza sobre a duração, observa, há outra sobre o tratamento. Até 2008, o remédio era monetário: baixar juro. Agora, as taxas estão baixas, algumas até negativas (abaixo da inflação).
- A questão é o que vai se fazer e qual o poder do que vai ser feito. Será preciso testar outras saídas, com política fiscal (gasto público).
Crise! Que crise!
O Sebrae-RS suspendeu todos os eventos coletivos, internos ou externos, de 14 a 29 de março, em todo o Estado.
O Conselho Regional de Contabilidade (CRCRS) cessou todos os eventos do mês, inclusive a posse da diretoria, no dia 24.
A Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) cancelou o 9º Encontro de Resseguro, que seria em 15 e 16 de abril.
Evento para startups em São Paulo do escritório gaúcho Silva Lopes previsto para o dia 16 foi adiado.
Crise? Que crise?
Os investimentos da RGE no Estado em 2019 foram 13,4% acima do ano anterior, e alcançaram R$ 884 milhões em obras de ampliação e melhoria da rede elétrica.
O Colégio Sinodal, de São Leopoldo, encerrou 2019 com 1.266 alunos e terá 1,4 mil matriculados ao longo deste ano. Nos últimos três anos, o crescimento chega a 10%.
A Safeweb Segurança da Informação projeta ampliar em 35% o número de pontos de emissão de certificados digitais no Brasil em 2020. Serão 280 apenas em São Paulo. Estima crescimento de 30% no faturamento este ano.
A SEMANA QUE EU VI
Choque reverso
A semana começou com um choque reverso do petróleo: em vez da disparada, como nos anos 1970 e 1980, a cotação do barril despencou. A Arábia Saudita cortou seus preços em retaliação à Rússia, que não topou cortar produção. No mercado financeiro já estressado com o coronavírus, o combustível barato incendiou o pânico.
Curto circuito
Foi preciso acionar por quatro vezes na semana o circuit breaker, mecanismo que paralisa a bolsa de valores: na segunda, por choque do petróleo, na terça, com admissão de pandemia pela OMS e, na quinta-feira, duas vezes, com a proibição de voos europeus nos EUA.
Pílulas de PIB
Para acalmar o mercado, o Federal Reserve (Fed, BC dos EUA) garantiu liquidez (conversão de ativos em dinheiro) de até US$ 5 trilhões. Isso é um quarto do PIB dos EUA e mais de duas vezes o do Brasil. Foi preciso elevar a dosagem, porque uma "pílula" de US$ 1,5 trilhão não havia provocado o efeito esperado.
Mundo ligado
Tudo na sexta-feira: na Alemanha, programa ilimitado de crédito para empresas. Na China, liberação de US$ 79 bilhões em depósitos compulsórios. No Japão, programa de compra de títulos de US$ 1,9 bilhão e crédito adicional de US$ 13,9 bilhões.
MARTA SFREDO
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