terça-feira, 6 de dezembro de 2016



06 de dezembro de 2016 | N° 18707 
EDITORIAIS

A PREVIDÊNCIA E A CRISE POLÍTICA

Encarada pelo governo como prioritária depois da definição do teto de gastos, iniciativa ainda dependente da segunda votação do Senado para entrar em vigor, a reforma da Previdência chega hoje ao Congresso no auge da crise política do parlamento, em decorrência do afastamento do presidente Renan Calheiros pelo Supremo Tribunal Federal. De acordo com liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Melo, um réu não pode ocupar a linha sucessória da Presidência da República.

O debate da questão previdenciária, como evidenciou ontem o presidente Michel Temer, é ina- diável. O país não tem como sair da crise, reativar sua economia e voltar a gerar empregos se não estancar as fontes de desequilíbrio no orçamento federal. A Previdência, vista pelos números, sem apelos emocionais, é uma das que mais contribuem hoje para desequilibrar o déficit público.

No ritmo atual, como ressaltou ontem o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o percentual de idosos deve ampliar-se em 263% até 2060, tornando o sistema insustentável. Adaptar a seguridade às mudanças demográficas é uma exigência que não tem como ser postergada. Esse promete ser um dos focos das mudanças, que devem exigir idade mínima e um tempo mínimo de contribuições para os que serão afetados pela reforma, entre os quais não se incluem os já aposentados.

Quanto menos privilegiarem segmentos específicos, mais as reformas previstas na aposentadoria terão condições de vencer as resistências. Independentemente do desfecho da crise política, o Congresso tem o dever de enfrentar o assunto com a urgência e a seriedade que a situação requer. O país não tem como esperar o colapso do sistema para promover mudanças, pois isso inviabilizaria o próprio setor público, com consequências irreversíveis para a economia de maneira geral.

TRAGÉDIAS PREVENÍVEIS

As investigações do acidente com o avião que conduzia a Chapecoense ainda estão em andamento, mas já se sabe que a causa maior do desastre foi o conjunto de irresponsabilidades das pessoas que permitiram o voo arriscado, com combustível suficiente apenas para o percurso planejado. Sem desconsiderar a dor da família do piloto boliviano que morreu na queda, parece não haver dúvida de que ele foi o responsável maior pela insensata aventura, já tendo feito outras viagens em condições semelhantes e ocultando da própria tripulação informações precisas sobre o voo. A imprudência do profissional da empresa LaMia, respaldada pela funcionária da Direção-Geral de Aeronáutica Civil da Bolívia, deixou 71 pessoas mortas, seis outras feridas e dezenas de famílias enlutadas.

Ainda que sejam episódios de natureza e consequências diversas, o incêndio da boate Kiss, no Rio Grande do Sul, e o rompimento das barragens da mineradora Samarco, em Minas Gerais, também foram gerados pela incúria, pelo descaso com as normas e recomendações técnicas, e também pela ganância – todos fatores que compõem a cultura da irresponsabilidade. Tragédias preveníveis ocorrem porque alguém, em algum momento, achou que desobedecer às regras não daria em nada. E também porque autoridades e órgãos fiscalizadores foram relapsos no cumprimento de suas atribuições.

O problema do jeitinho, no seu pior sentido, requer uma transformação cultural dos brasileiros, que se habituaram a tolerar desleixos, a aceitar pequenos desvios de comportamento e a considerar normal o descumprimento de normas e convenções coletivas. Mas há uma providência simples que pode evitar muitas tragédias: acabar com a impunidade.

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