segunda-feira, 12 de dezembro de 2016




12 de dezembro de 2016 | N° 18712
POLÍTICA + | Rosane de Oliveira

DELAÇÃO DO APOCALIPSE SÓ COMEÇOU


A primeira onda do tsunami anunciado a delação premiada da cúpula da Odebrecht provocou estragos nas estruturas do governo Michel Temer e atingiu os pilares da ponte para o futuro. A delação de Cláudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais, é apenas o começo. São 77 executivos que esmiuçaram suas relações com políticos de diferentes partidos e detalharam um esquema complexo, porque mistura corrupção com doações legais e ilegais para campanhas. Separar uma coisa da outra é tarefa que exigirá milhares de horas de trabalho da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário.

O problema do presidente Michel Temer não é apenas ter sido citado como a pessoa que negociou com Marcelo Odebrecht uma doação de R$ 10 milhões para o PMDB, em jantar no Palácio do Jaburu. Desse total, R$ 6 milhões teriam sido repassados ao presidente da Fiesp, Paulo Skaf, e R$ 4 milhões entregues ao ministro Eliseu Padilha para distribuição entre candidatos do PMDB. Padilha nega ter recebido esse dinheiro, mas é sabido que, por sua proximidade com Temer, era a ele que companheiros em dificuldade acorriam em busca de socorro financeiro do diretório nacional do PMDB.

O que deve tirar o sono de Temer é a fragilização de seu governo a partir dessa delação apocalíptica, que começa a ser divulgada no momento em que sua popularidade atingiu o nível mais baixo desde a posse, de acordo com pesquisa do Datafolha. Amanhã, o Senado deve aprovar a PEC 55, que fixa o teto dos gastos, mas só produzirá os efeitos esperados pelo mercado se vier combinada com a reforma da Previdência. Em um Congresso ameaçado pela Lava-Jato, será difícil aprovar uma reforma tão necessária quanto impopular.

Uma frase de Melo Filho resume as relações promíscuas da Odebrecht com o Congresso: “O propósito da empresa era manter uma relação frequente de concessões financeiras e pedidos de apoio com esses políticos, em típica situação de privatização indevida de agentes políticos em favor de interesses empresariais nem sempre republicanos”.

ALIÁS
Os delatores nada têm a ganhar quando mentem. Pelo contrário, podem perder os benefícios do acordo. Logo, dizer que os delatores mentem é uma linha de defesa muito frágil.

RECEBER DINHEIRO EM TROCA DE ALTERAÇÕES EM MEDIDAS PROVISÓRIAS NÃO PODE SER CARACTERIZADO COMO DOAÇÃODE CAMPANHADE CAIXA 1 OU 2. O NOME DISSO É CORRUPÇÃO.

AVARIA NA CÚPULA
A imagem acima, que mostra os caciques do PMDB comemorando a decisão de desembarcar do governo Dilma Rousseff, em março deste ano, foi a que levou o ministro Luís Roberto Barroso a fazer, à época, um desabafo diante de um grupo de alunos da Fundação Lemann, em visita ao Supremo Tribunal Federal:

– Quando, anteontem, o jornal exibia que o PMDB desembarcou do governo e mostrava as pessoas que erguiam as mãos, eu olhei e (pensei): Meu Deus do céu! Essa é a nossa alternativa de poder. Eu não vou fulanizar, mas quem viu a foto sabe do que estou falando.

Nove meses depois, a declaração (que o ministro não sabia que estava sendo transmitida pelo circuito interno) está sendo lembrada pela atualidade. Do grupo que estava na linha de frente do PMDB à época, Eduardo Cunha está na cadeia em Curitiba, Romero Jucá, Eliseu Padilha, Moreira Franco, Geddel Vieira Lima e Eunício Oliveira são citados na delação de Cláudio Melo Filho como negociadores ou receptores de somas milionárias da Odebrecht.

DIRETAS FORA DE HORA
Defender eleições diretas como saída para a crise poderia ser uma boa ideia, não fossem alguns senões:

1. Não há previsão legal para eleição. Caso Michel Temer caia em 2017, a Constituição prevê que o Congresso elegerá o novo presidente.

2. Ainda que se mudasse a lei para escolher o presidente-tampão por voto direto, nada garante que o eleito não seria tragado pela Lava-Jato.

3. Sem uma reforma política, antecipar a eleição poderia ser o primeiro capítulo de uma nova crise.

NADA CONSTA
O senador Romário (PSB-RJ) foi citado na delação de Cláudio Melo Filho, mas o que ele diz equivale a um atestado (temporário) de bons antecedentes.

O ex-diretor de Relações Institucionais conta que um dos diretores da empreiteira sugeriu fazer uma doação para agradar a Romário, mas outro vetou porque na propaganda o ex-jogador aparecia falando mal da Odebrecht.

“Pelo que me consta, nenhuma contribuição foi realizada”, diz na delação.

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