22 de dezembro de 2016 | N° 18721
DAVID COIMBRA
Como reagir às mudanças no Estado?
O Luís Augusto Fischer, conhecido e reconhecido professor de literatura de Porto Alegre, fez ontem a observação mais iluminada de todas as já feitas em relação às reformas protagonizadas pelo governo do Estado. O Fischer escreveu o seguinte, na timeline de sua página no Facebook:
“Amigos, me passa pela cabeça uma coisa: precisamos não desperdiçar a energia coletiva que nos fez resistir até aqui, em favor da cultura, da ciência, da alegria, da ecologia, do futuro. Não sei como nem por onde começar, mas acho que de algum modo a gente teria que manter essa pegada. Algo em torno de acreditar na força da sociedade, das energias que há por aí. Sem perder de vista o combate político, parlamentar etc., mas, enfim, agregar o que temos visto. ONG? Um jornal/site/revista? Uma rádio web? Alguém se candidata a palpitar em torno dessa ingenuidade?”.
Não é ingenuidade. O Fischer tocou num nervo exposto da sociedade brasileira e, sobretudo, da gaúcha. Nós nos acostumamos com a tutela estatal, o que nos tirou exatamente essa energia à qual ele se referiu.
O que há de melhor e mais vigoroso no Rio Grande do Sul foi forjado pela iniciativa da sociedade organizada à parte dos governos. Quando o Estado entrou, entrou como apoio. Tudo bem, aí o Estado é benéfico. Mas, quando o Estado toma o controle, a energia se esvai.
É humano. É lógico. Por que vou fazer algo, se tem alguém que faz por mim?
Um dos bons exemplos é a Feira do Livro, concebida, montada e patrocinada pelos livreiros da cidade. Em meio século de atuação, houve mudanças, é claro, mas a fonte de força da Feira continua sendo aquela gerada pela célula fundadora.
Agora, as entidades que mais ilustram essa verdade são Grêmio e Inter. Esses dois clubes mais que centenários são a expressão viva da organização da sociedade gaúcha. Eles não são exatamente privados e definitivamente não são estatais. São instituições públicas mantidas pelo empenho privado de cada cidadão. Não há intervenção estatal em Grêmio e Inter, nunca houve. Pode haver ajuda, pode haver colaboração, mas o Estado jamais se intrometeu no funcionamento desses dois gigantes. Tivesse se intrometido, seriam dois anões.
O que há de maior, no Rio Grande do Sul, do que a dupla Gre-Nal? Olhe para a Arena do Grêmio e para o Beira-Rio, olhe bem e lembre-se de que ali há concentração, dedicação e vontade da sociedade gaúcha.
Por que a sociedade gaúcha não pode se organizar em favor de outras causas e de outros projetos? Por que temos de esperar que a iniciativa venha de cima, desse suposto pai provedor, que é como encaramos o Estado? Por que até as organizações não governamentais têm de ser governamentais?
Há duas semanas, o Inter foi rebaixado à segunda divisão. Nesse breve período de tempo, 3 mil colorados se associaram ao clube. Não houve sequer campanha para que isso fosse feito. Foi uma mobilização espontânea da sociedade.
O professor Fischer, sei, é colorado. Já deve ser sócio do Inter. Imagino que poderia ser sócio também do zoológico. E você, que é gremista, poderia se associar ao jardim botânico. Ou até ostentar orgulhosamente a carteirinha de um museu. Ou participar do financiamento de uma revista.
Por que não? Sei que você pode. Sei que nós podemos.
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