05 de julho de 2015 | N° 18215
MOISÉS MENDES
Os maus perdedores
Eduardo Cunha é o mais assustador político brasileiro desde
Fernando Collor. Seria, dizem, um exemplo de como a política pode ser deformada
pela radicalização de condutas religiosas.
Outros o consideram mais uma imitação dos antigos coronéis. E
há quem pense que é apenas um ressentido, investigado por corrupção,
inconformado com o governo que não lhe teria dado cobertura para fugir das
garras da Polícia Federal e do Ministério Público – como se isso fosse possível.
O presidente da Câmara é mais do que tudo isso. É a cara com
olheiras do Brasil dos maus perdedores. Cunha avisou, desde que chegou ao
trono, que não admitiria derrotas e venceu tudo. Deu seu maior show agora, na
votação da redução da maioridade penal.
Dizem que seria o líder da pauta conservadora que assombra o
Brasil. Não é. Ele é o preposto. Estão na pauta dois temas que poderão ser
votados logo pelo Congresso. Um é o chamado Estatuto da Família, que ameaça
tirar dos casais homoafetivos o direito de serem reconhecidos como tal e de
adotarem crianças (uma decisão de 2011 do Supremo).
O outro é a tentativa de fuzilamento do Estatuto do
Desarmamento, em vigor há 12 anos, para que sejam facilitados o porte e a posse
de armas. A turma que transformou religião em negócio lidera a primeira pauta,
e a bancada da bala comanda a segunda. Cunha, sentado no trono, é o
viabilizador desses anseios reacionários.
Maus perdedores são bem articulados. Vão tentar fazer com
que o país retroceda ao tempo em que um casal era apenas o formado por um homem
e uma mulher – e em que qualquer um poderia andar com uma arma (legalmente) na
cintura. O país idealizado por eles é o que poderá encarcerar adolescentes e
legitimar em lei a discriminação de gays.
Os maus perdedores incomodam-se com a inclusão social de
quem, além de micro-ondas e automóveis, passou a adquirir formação e
conhecimento. O mau perdedor está desconfortável com a possibilidade de
repartir espaços e privilégios de classe média com os que chegarão logo ao
mercado com diplomas de doutor.
Zero Hora já mostrou quem são os maus perdedores nas
universidades. Vergonhosamente, são também professores que se negam a admitir a
afirmação social dos cotistas. Porque a universidade, dizem, seria o espaço das
elites, e a elite, como diziam os aristocratas franceses do século 18, somente
será elite se for sempre a mesma.
A aristocracia acadêmica decadente do século 21 incomoda-se
com os cotistas, com nordestinos, haitianos, com beneficiados do Bolsa Família,
bolsistas do ProUni. Os maus perdedores entusiasmaram-se com a possibilidade do
golpe, poucos meses depois da eleição, planejam todos os dias o impeachment e
continuam fazendo a escolha seletiva dos bons e dos maus corruptos. Quase todos
aplaudem Cunha, alguns às escondidas.
Não nos enganemos. Eduardo Cunha não é manobrado pelo poder
dos evangélicos. Cunha foi um dos que politizaram os púlpitos e se aproveitaram
da estrutura das igrejas e de seus fiéis. Empoderou-se para ser cúmplice de
todos os maus perdedores e para eles trabalha.
Cunha não é o líder dos reacionários. É o capataz a serviço
deles, porque entendeu suas demandas. Mas será preposto somente até o dia em
que cometer um erro e for deixado à deriva, como a direita já fez com Fernando Collor.
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