quinta-feira, 21 de abril de 2011



CLÓVIS ROSSI

Classes, ou falta dela

SÃO PAULO - Era uma vez uma coluna sobre o custo abusivo da avenida Água Espraiada no governo Paulo Maluf. Publicado o texto, logo de manhã toca o telefone em casa e um leitor que se identifica como malufista começa a reclamar.

"Como é que você critica uma obra tão importante? A avenida não está lá? O que você queria, que ela não fosse feita?", pergunta, indignado, o interlocutor.

Tento responder que queria, sim, que a obra fosse feita desde que o custo não excedesse o do túnel sob o canal da Mancha. Não consigo vencer a indignação do leitor que acaba decretando: "Ah, vocês jornalistas são todos petistas" (estamos falando de um tempo em que petismo e malufismo pareciam ser incompatíveis).

Retruco: "Só falta dizer que somos também todos bichas".

E o leitor fecha o educativo papo com: "Quer saber? São mesmo".

Não sou preconceituoso a ponto de achar que todo malufista tem a mesma cabeça de meu interlocutor de antanho. Mas uma parte importante do malufismo/quercismo com quem Lula quer casar seu partido está impregnada de uma mentalidade que, nos velhos tempos, Fernando Henrique Cardoso batizou de "lúmpemburguesia".

É inevitável, pois, que a aproximação à chamada nova classe média, defendida tanto por Lula como por FHC, caminhe para ser um reforço ao conservadorismo a que ambos se entregaram, em nome do acesso ao poder.

É bom ressalvar que essa história de classes sociais está mal contada, mas Vinicius Torres Freire, cada dia melhor, já pôs as coisas no lugar outro dia.

Voltemos, pois. No mundo todo, as classes médias estão se entrincheirando no conservadorismo em todos os aspectos. No Brasil em que o receio de uma recaída no lado D da vida deve ser maior, fico até com medo de imaginar como será o, digamos, ideário da aproximação.

crossi@uol.com.br

Nenhum comentário: