sexta-feira, 29 de abril de 2011



29 de abril de 2011 | N° 16685
DAVID COIMBRA


As coisas que não vou escrever sobre o RS

Estava decidido a escrever que os gaúchos acreditam em bandidos e mocinhos. Que, para os gaúchos, a vida é um Gre-Nal. As coisas são boas ou más, certas ou erradas. É uma existência sem matizes, sem gradação. Tudo é branco ou preto. Donde, o entredevoramento histórico dos rio-grandenses.

O governador do PT faz algo, o sucessor anti-PT vai lá e desfaz. E vice-versa. O gaúcho acredita MESMO que alguém se alça ao poder só para praticar o Mal. Obviamente, o alguém que é do outro partido.

Então, esse alguém não é digno de nenhuma colaboração, para ele só se reserva a oposição explícita e a sabotagem implícita. Pobre Olívio, pobre Yeda, pobres todos os que tentam construir algo no Rio Grande. Eles nunca são julgados com condescendência, para eles não existe a compreensão racional, média e fria. Não. Para eles só há o amor do simpatizante e o ódio do inimigo, e nenhum deles vale muito, porque ambos são incondicionais.

Também estava decidido a escrever sobre o regionalismo obtuso do gaúcho. Em muitos outros lugares do Brasil, como na Bahia, o regionalismo serve para universalizar a cultura, para levar a Bahia ao mundo. Aqui, serve para isolar o Estado do mundo. Não é regionalismo, é provincianismo. Dia desses, um jogador do Botafogo reclamou de um juiz gaúcho, desabafando:

– Eles nem querem fazer parte do Brasil...

Foi criticado pelos gaúchos que não viram, naquela manifestação inocente, o que o resto do Brasil vê nos gaúchos.

Estava decidido também a escrever que essas são as causas do estrondoso atraso do Rio Grande do Sul. Quem quer que visite outros Estados da federação se espanta com isso. As coisas, no Brasil, estão acontecendo. Aqui não. Aqui as estradas estão congestionadas, a Educação regride, as ruas se tornam mais perigosas e os projetos, quaisquer projetos, dormem décadas nas gavetas dos gabinetes. O Rio Grande do Sul ideologizado, ranzinza, rançoso, antropofágico, anda para trás.

Pois bem, estava decidido a escrever isso tudo, mas afinal resolvi que não. Resolvi escrever sobre o Rio Grande do Sul que funciona. Encontrei um. Está lá no alto, na Serra: o complexo Gramado & Canela.

Você pode não gostar de ir a Gramado, mas terá de reconhecer, se lá for: lá existe um movimento orgânico pelo bem comum. A comunidade inteira se envolve no projeto da cidade. Ou da região.

A forma como você é tratado nos hotéis e restaurantes, a forma como os motoristas se comportam no trânsito, tudo faz parte de uma consciência coletiva. As pessoas, em Gramado e Canela, trabalham unidas por Gramado e Canela, numa comunhão do poder público com a iniciativa privada que é ágil e funcional.

Como eles conseguiram? Como criaram esse oásis de entendimento nesse deserto de eterna oposição? Temos de descobrir isso. Temos de estudar esse fenômeno. Então, talvez haja uma esperança de vida jovem para esse reumático Rio Grande do Sul.

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