segunda-feira, 5 de setembro de 2011



05 de setembro de 2011 | N° 16816
PAULO SANT’ANA | LUIZ ANTÔNIO ARAUJO - INTERINO


Bem-vindos, gaúchos

Num mês recheado de feriados e às vésperas da primavera, aproveito este espaço para fazer uma sugestão a você, leitor que não sabe aonde levar as crianças: vá conhecer o Rio Grande. Sim, o do Sul. Não deixe os meninos crescerem como você e eu, na ignorância do Estado onde nasceram.

Antes que alguém se ofenda, me explico: nós, que andamos pela meia-idade e, assim, somos em alguma medida responsáveis por tudo isso que está aí, ignoramos a terra onde nascemos. Se não fosse assim, a história do Rio Grande seria bem tratada não apenas nos livros, mas também na vida real.

Considere, por exemplo, a Capital. Quem chega a Porto Alegre por estes dias com intenção de saber algo sobre seu passado tem pouco a ver além do Museu Julio de Castilhos, do Memorial do Rio Grande do Sul e de outras duas ou três instituições.

Não dispomos de um amplo rol de visitas guiadas, de dramatizações como o consagrado espetáculo Som e Luz nas ruínas de São Miguel ou mesmo de mapas que garantam ao visitante um passeio histórico self service. Mesmo o bom Porto Alegre Linha Turismo, em funcionamento há quase 10 anos, passa batido por locais e episódios que mereceriam mais atenção.

Há passeios monitorados em prédios históricos específicos, como o Solar dos Câmara, que uma vez hospedou Dom Pedro I. O estúdio de rádio no porão do Palácio Piratini foi restaurado (no governo Yeda Crusius, justiça seja feita). A Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz encena o espetáculo Viúvas na Ilha das Pedras Brancas, que serviu como prisão política. Poucos sabem disso.

Quem acaba suprindo a lacuna são os historiadores. Mas esses deveriam ser o ponto de partida, e não o de chegada, na recuperação da memória da cidade. Qual turista, em poucos dias de folga, poderia comprar o essencial Porto Alegre Sitiada, de Sérgio da Costa Franco, ou o belo Rua da Praia – Um Passeio no Tempo, de Rafael Guimaraens, Marco Nedeff e Edgar Vasques?

Quem vê as falhas da Capital no terreno do turismo histórico não imagina que, na Metade Sul, palco privilegiado da Revolução Farroupilha e de outras façanhas das quais muito nos orgulhamos, as coisas são piores. Rendemos homenagens à bandeira verde, amarela e vermelha, mas ainda não fomos capazes de demarcar com precisão o local da Batalha do Seival, ao final da qual foi proclamada a República Rio-Grandense.

As capitais farroupilhas (Piratini, Caçapava do Sul, Alegrete e, segundo alguns, Bagé) pouco conservam do passado épico. O Parque Bento Gonçalves, em Cristal, vive desde os anos 1970 à espera de recursos que nunca chegam.

Apesar de tudo, alguém sempre acaba descobrindo o Rio Grande. O professor de história René Gertz, da PUCRS, gosta de contar, em tom bem-humorado, a impressão causada em Porto Alegre pela chegada do historiador americano Joseph Love, nos anos 1960. À frente de uma trupe de pesquisadores e técnicos, Love mergulhou nos arquivos de Borges de Medeiros e saiu de lá com a tese que se tornaria O Regionalismo Gaúcho, livro clássico até hoje.

Em 2002, o diretor paulista Jayme Monjardim gravou a minissérie A Casa das Sete Mulheres em Pelotas, encantou-se pela região e acabou adquirindo e restaurando a Estância da Figueira, onde viveu a irmã de Bento Gonçalves, em Camaquã.

Ainda é tempo de fazer alguma coisa para que os vestígios da história do Rio Grande não desapareçam. Mas, para isso, é preciso antes descobrir esse imenso patrimônio. Há dezenas de pequenas iniciativas levadas a cabo por historiadores, professores, herdeiros e pesquisadores autodidatas para que isso aconteça. Uma delas pode ser visitada de passagem por quem vai a Jaguarão fazer compras no freeshop da margem uruguaia do rio.

Trata-se do Museu Carlos Barbosa. Nesse casarão, construído em 1886, viveu a família do médico, governador e companheiro de Julio de Castilhos e Borges de Medeiros. O visitante que passeia pelas peças tem a impressão de que os donos acabaram de sair para um passeio:

há mobiliário, louças, obras de arte, fotografias, a maleta do proprietário e até lâmpadas originais. O local é mantido por uma fundação criada pelos herdeiros de Barbosa.

Aproveite, leitor, o que houver de tempo bom neste setembro e desbrave uma terra exótica e desconhecida. Conheça o Rio Grande do Sul.

Nenhum comentário: