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quinta-feira, 2 de junho de 2011
02 de junho de 2011 | N° 16718
L. F. VERISSIMO
Pedaços de metal
Nietzsche escreveu em algum lugar que certas ideias se tornam verdades pela repetição, mas perdem o significado com o tempo, como moedas cujas imagens se apagam e passam a ter, todas, apenas o valor de pedaços de metal. Me ocorreu que a metáfora do Nietzsche pode ser usada ao contrário para descrever o que acontece com o euro, a moeda única idealizada para uma Europa unida que parece estar em vias de perder o sentido.
No caso do euro, a intenção era que as moedas valessem o mesmo para todos os membros do mercado comum, independentemente do estado das suas economias.
Mas, ao contrário dos pedaços de metal de Nietzsche, com o tempo certos euros ganharam um valor real que para outros é artificial. E o valor dos euros saudáveis é ameaçado pelas repetidas crises dos euros anêmicos.
As outras tentativas de criar uma Pan-Europa fracassaram por razões diferentes. Napoleão quis levar a revolução francesa para além das fronteiras da França e do seu próprio poder e provocou uma reação da Europa monárquica que acabou não só com suas pretensões imperiais mas com o regime revolucionário que o pariu. Ironicamente, Napoleão criou uma união europeia – a dos velhos regimes que se uniram para detê-lo e à ameaça republicana.
Decisiva na derrota de Napoleão e do seu sonho foi a resistência da Inglaterra, aquela estranha ilha que, para quem vive dizendo que não é Europa, tem tido uma participação desproporcional na história europeia.
A Inglaterra também foi, em grande parte, responsável pela derrota de Hitler, outro que sonhou com uma federação europeia e propôs sua Europa fascista como um baluarte contra o bolchevismo e as “hordas asiáticas” que já estariam na margem oriental do Danúbio prontas para atacar a civilização ocidental.
Uma proposta aceita por muita gente boa, na época.
A atual tentativa de unir a Europa partiu de uma conveniência de mercado, nada tão grandiloquente quanto as pretensões bonapartistas e nazistas. Em vez de um ideal revolucionário ou da civilização cristã, pretendeu-se defender a relevância da Europa no mundo da competição capitalista. Começando pelos pedaços de metal, pois, afinal, o dinheiro é que manda neste mundo. Também não está funcionando.
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