11 DE SETEMBRO DE 2021
MONJA COEN
O 11 DE SETEMBRO E O HOJE
Minha filha me chamou: "Mãe. Venha ver na TV". E vimos juntas o segundo avião entrar no World Trade Center de Nova York. Onze de setembro. Inacreditável. Terrível. Trágico.
No mesmo dia, viajaria para Juiz de Fora, um encontro inter-religioso. Senti-me um fracasso total.
Há anos nos reuníamos, líderes das mais diversas tradições espirituais com o propósito de criar uma cultura de paz, justiça e cura da Terra. Depois de tantos encontros e sonhos, vimos dois aviões explodindo os edifícios das trocas mundiais, do comércio internacional. Como foi difícil participar do seminário na universidade. Grande esforço para renovar a esperança, para não chorar pelos mortos, pelos vivos, pelos absurdos todos que nós humanos podemos criar.
Leandro Karnal lançou este ano um livro chamado A Coragem da Esperança. A esperança é corajosa ou temos de ter coragem para esperançar? Verbo esperançar de não desistir, de fazer acontecer. Não às violências, aos abusos, às morte prematuras, aos descuidos, à desgovernança geral. Hoje, ontem e sempre.
Na Síria, atacam escolas com bombas. Crianças queimadas - algumas sobrevivem marcadas para sempre. No Afeganistão, as mulheres tremem frente a um governo talibã, que as proibia de estudar e sair na rua sem a presença de um homem - mesmo que fosse um menino pequeno.
Há tantas coisas acontecendo simultaneamente. A nostalgia do final dos Jogos Paralímpicos e a esperança de reencontrar atletas e arte na França, em 2024. Tudo que começa termina, mas continua, num movimento de ir e vir como as ondas do mar. Ah! Se pudesse terminar o mal e continuar o bem a crescer.
Algumas vezes sinto saudades de mim. Aquela jovem que descobriu o Zen, que se entregou ao monasticismo, que acreditava tão firmemente nos ensinamentos e textos sagrados. Anos se passaram. Reencontrei hoje o meu missal dos tempos de noviciado.
As páginas amareladas, uma fita transparente colando páginas que se separavam de tanto uso. As marcas de meus dedos jovens ficaram impressas nas capas e nas páginas tantas vezes percorridas.
Saudades de tempos idos. Meus dedos ficaram tortos e grossos de artrose, como os de meu pai, minha mãe, minha avó. Missal todo em japonês, com anotações à lápis, quase que apagadas. Poucas. Orgulhava-me de abrir na página exata, sem precisar de marcadores. Sentia-me unida com o Caminho, com as liturgias. Sentava-me em posição de lótus completa, fazia prostrações até o chão com delicada harmonia e respeito. Praticava a arte da Cerimônia do Chá, no silêncio de uma sala onde podia ouvir o vento nos pinheirais. Aprendia caligrafia e arranjo de flores. Aulas de poesia chinesa e de histórias para crianças. Costura de hábitos monásticos e leitura de textos clássicos, sutras milenares.
Andar sem ser percebida, suavemente. Deslizar pelas escadarias e corredores sem fazer ruído. Não foi fácil.
Sem notícias de guerras, de violências. Apenas as preces nos cemitérios de Nagoya, com estátuas de soldados mortos e o monumento de uma bomba, lembrando as destruições do passado.
O missal trouxe de volta uma pessoa que eu esquecera e que ainda vive em mim. No final de semana passado, estive em um retiro híbrido - parte virtual, parte presencial. Foi em São Leopoldo, no Centro de Espiritualidade Cristo Rei. Como fez bem sentar em silêncio de sexta-feira à tarde a domingo à tarde. Saudades dos tempos de estar presencialmente, caminhar pelos jardins em fila indiana, praticar a respiração consciente e presença pura.
O missal, aqui ao meu lado enquanto digito, trouxe de volta a mim mesma.
Meus votos, meu compromisso e as preces necessárias para manter viva a coragem da esperança. Ainda é tempo. Podemos reverter o descuido em cuidado, o desamor em afeto, o ruído em silêncio. Penetrar o sagrado e crer que estamos sendo capazes de maior inclusão, menos racismo e preconceito. Ainda há tanto a ser feito. Que bom ter nascido neste tempo, nesta era axial, onde juntos podemos escolher e cultivar amor e paz.
Mãos em prece
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