14 DE SETEMBRO DE 2021
DAVID COIMBRA
Sobre detetives misteriosos
Gosto de filme de detetive. Nem sei qual é o meu preferido. Talvez o Columbo. Via Columbo com a minha mãe, quando era pequeno. Queria rever, mas não encontro em parte alguma. Era uma série de detetive diferente. Na primeira meia hora, o Columbo não aparecia. Era a parte dedicada ao criminoso. Mostrava, com pormenores, como ele cometeu o assassinato e o que fez para encobri-lo. Sempre era uma pessoa sofisticada, rica e bem-educada. O crime era tão bem-feito que parecia impossível de ser descoberto.
Aí entrava o Columbo. Humilde, hesitante, vestindo uma capa amarfanhada, despenteado e fumando um charuto apagado, ele chegava e começava a cercar o assassino. Fazia perguntas aparentemente sem sentido, mas que eram importantes para que ele compusesse o quadro do assassinato. O criminoso, que no início sentia certo desprezo por aquele detetive mal-amanhado, aos poucos percebia que Columbo estava se aproximando da verdade, e se agastava, e às vezes até o destratava.
Além da evidente inteligência superior de Columbo como atrativo para a série, havia ali uma espécie de luta classista, do detetive que não se importava com as aparências enfrentando uma figura que era movida pelas aparências. Era inteligência versus poder. E a inteligência vencia.
Estou relembrando tudo isso sobre o Columbo porque encontrei um detetive parecido com ele. Harry Ambrose, seu nome. É o detetive protagonista da série The Sinner, que está na Netflix. Ambrose é interpretado por Bill Pullman, um ator de sorriso triste, que olha meio de lado para o interlocutor. Ele nunca parece estar completamente seguro da situação que está enfrentando, a impressão é de que ele tem algo a dizer, mas evita se manifestar por modéstia ou recato. De certa forma, semelhante ao jeito elíptico do Columbo.
Isso me leva a pensar que pessoas que calam mais do que falam têm sempre o mistério a seu favor. Ele não diz nada do que sabe, mas parece saber muito. Exatamente ao contrário do que ocorre com os frequentadores das redes sociais. As pessoas a todo momento dão sua opinião, e a todo momento decepcionam. Como era bom o tempo em que eu não sabia o que pensavam as outras pessoas. Só podia me desencantar com os que tinham de falar por profissão, como políticos e jornalistas. Os outros, por sinal a grande maioria, eram protegidos da própria estupidez pelo silêncio. Você olhava para alguém reticente e pensava: pode ser um Columbo. Hoje, não. Hoje, todos os crimes de personalidade foram descobertos.
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