Você é forte?
Não chamo minha esposa de forte. Nem minha mãe, nem minha irmã, nem minha filha, muito menos minhas melhores amigas.
Dentro de mim, é uma palavra proibida. Porque parece um elogio, mas não é.
Há uma natureza perversa no incentivo: você é obrigado a aguentar tudo sem reclamar. Representa um empurrão ao sofrimento silencioso. Quem é forte não chora. Quem é forte não pede ajuda. Quem é forte suporta o aumento interminável de demandas, encargos e tarefas.
Quando você diz que alguém é forte, está avisando que nada o atinge - o que é uma mentira. Está insinuando que não tem limites - o que é um descalabro. A suposta fortaleza vem sendo um artifício social para explorar as pessoas bem-intencionadas. Para evitar confissões. Para bloquear socorros psicológicos. Sendo forte, você não precisa de ninguém. Dá conta sozinho do excesso insalubre.
É o atalho para adoecer, para se estressar, para explodir, o aliado incontestável da síndrome de burnout, o facilitador do esgotamento físico, da pressão moral, do esfacelamento emocional. Você se vê na obrigação de corresponder às expectativas de resiliência e não falar da sua situação desconfortável, do que está incomodando, do desejo por mudanças e por dividir as tarefas.
No caso das mulheres, tem sido uma arma masculina para que elas cuidem da casa, da criação dos filhos, do casamento, do trabalho, sem coparticipação. Afugenta qualquer possibilidade de equiparação salarial, já que o adjetivo inibe toda reivindicação ou necessidade.
Junto do "forte", surgem exaltações como "guerreira" e "lutadora", sempre para expressar sacrifícios e privações, nunca para enaltecer escolhas pessoais. Você deixa de fazer o que quer, você deixa de ser.
É sempre sinal de sofrimento e de condições adversas. Ser forte é um desaparecimento individual em nome de uma causa: ou a prosperidade, ou o amor, ou a família. Traz em seu lastro uma antifragilidade, não cedendo espaço para a exposição de críticas ou de inconformismo com a realidade.
O beneficiado com sua força nunca é você. Não se é forte na luz, somente na sombra. É uma maneira de silenciar a recompensa, de ocultar os méritos, de mitigar o esforço.
Dessa forma, requerer a revisão das responsabilidades emerge como uma fraqueza, como se você não fosse suficiente para resolver as suas atribuições. Sugere incompetência, acabando por oferecer a mensagem de que não é apto para determinados papéis. Ou você é forte, ou você está fora. Percebe-se um extremismo do descarte na atitude. Não encerra um dilema, porém uma imposição.
Existe um alto grau de coerção e de humilhação no aparente elogio, pois você não tem liberdade para contestar as infinitas solicitações que recebe. Encontra-se amordaçado, incapaz de responder que não é forte. Seria o equivalente a um fracasso perante o reconhecimento público.
Tudo o que não pode ser recusado é manipulação. A vulnerabilidade é um dom que nos protege de estar onde não merecemos.
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