quinta-feira, 29 de junho de 2023


29 DE JUNHO DE 2023
CARPINEJAR

Quem nunca?

Espremeu a pasta de dente até ela confessar quem usou a sua escova.

Cortou o outro lado do tubo para o derradeiro esguicho da pasta na escova.

Abriu conserva de pepino ou de palmito sabendo que estava vencida e disse: "são apenas alguns dias, ninguém vai morrer".

Contou vantagem de ter comprado um carro seminovo, eufemismo para um veículo velho.

Pôs um adesivo no carro e se arrependeu na hora de tirar.

Esqueceu o forno aceso após servir o assado.

Avisou para uma visita não reparar na bagunça quando tudo estava fora do lugar.

Deixou uma última volta do papel higiênico somente para não trocar o rolo.

Comeu alimento que caiu no chão, aplicando a regra dos cinco segundos.

Misturou água com o restinho do xampu, chacoalhou e fingiu que estava novo.

Uniu restos de sabonete boiando no box do banheiro para formar um segundo sabonete Frankenstein.

Tentou remendar a tira das Havaianas com isqueiro.

Exagerou no desodorante pela culpa de ter cabulado o banho.

Requentou pedaço de pizza como café da manhã.

Postou uma selfie esquecendo o que havia no fundo da imagem.

Pregou um quadro para esconder as infiltrações da parede. Ou encheu a geladeira de ímãs para cobrir os arranhões.

Molhou com a língua a ponta dos dedos para virar as páginas das revistas.

Passou o dedo no chantilly de uma torta de aniversário.

Lambeu a tampa do iogurte.

Reutilizou o sachê do chá.

Colocou manta no sofá para disfarçar manchas e rasgos.

Carregou docinhos de uma festa enrolados em guardanapo, na bolsa ou no bolso do casaco.

Pulou de roupa na piscina da casa de um amigo.

Levou cerveja marca-diabo para um churrasco e só bebeu lá uma de melhor qualidade.

Inverteu as pilhas de lugar no controle remoto para ver se ele voltaria a funcionar.

Confundiu caipirosca com salada de frutas numa festa e ficou garfando os morangos.

Pediu para embrulhar sobras simbólicas da refeição em um restaurante avisando que era para o seu cachorro.

Repassou presentes que recebeu e não gostou no amigo-secreto da firma.

Coçou o ouvido com tampa da caneta Bic.

Entrou em bares ou lanchonetes somente para ir ao banheiro e não consumiu nada.

Saiu de casa com meia e chinelo, acreditando que logo voltaria. Encontrou seu chefe no caminho.

Mentiu que não foi você que devorou a última fatia do pudim na geladeira (apesar da consciência de que não era sua).

Você pode achar que isso é o cúmulo da pobreza, mas é o apogeu da espontaneidade.

Se não se identificou com nenhum item da lista, ainda não aproveitou a simplicidade desconcertante da existência, feita de singelos e perdoáveis pecados.

São transgressões aceitáveis da melhor vivência, muito além da sobrevivência.

Sofre do medo de desagradar. Tampouco descobriu que viver é um permanente vexame.

CARPINEJAR

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