Cobrar taxa para embarcar primeiro é certo?
Em meio a polêmicas recentes nos aeroportos brasileiros envolvendo o despacho da bagagem de mão, outro debate ganhou os holofotes da aviação civil: a cobrança de uma taxa para garantir o embarque prioritário em voos - e, consequentemente, a acomodação de bagagens de mão antes dos demais passageiros.
A medida é adotada pela Latam. Instituído há um ano, o Embarque Premium da Latam tem, segundo a companhia, o objetivo único de oferecer um embarque "mais rápido ao passageiro que opte pela facilidade". Assim, ao adquiri-lo, por R$ 10 por trecho, o cliente embarca no Grupo 3 - sempre depois dos passageiros com prioridade por lei, o chamado Grupo 1, e dos clientes Black e Black Signature do Latam Pass, que integram o Grupo 2.
O produto "não garante espaço nos bins (bagageiros acima dos assentos) para acomodação de bagagem", sendo o seu propósito o embarque com prioridade, frisa a empresa. A acomodação prioritária da bagagem de mão no compartimento superior "torna-se mais fácil" como consequência, alega a Latam. Contudo, em simulação de compra de passagem feita ontem pela reportagem, foi constatado anúncio oferecendo: "Embarque antes e garanta espaço para sua bagagem de mão".
Outras grandes companhias que operam no Brasil não adotam o mesmo serviço. Em nota, a Gol informa que oferece prioridade de acomodação de bagagem de mão em compartimento exclusivo apenas para clientes com poltrona GOL+ Conforto, em voos domésticos, e para clientes da classe Gol Premium Economy, em voos internacionais. A Azul informou em comunicado que, após o embarque prioritário por lei, os clientes TudoAzul nível Diamante, do programa de fidelidade da companhia, possuem o benefício do embarque prioritário.
Permitido
Para a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o serviço oferecido pela Latam é legal. O órgão regulador destaca que os grupos que devem receber prioridade no atendimento (incluindo o embarque) estão especificados na legislação. A Anac acrescenta que as empresas aéreas podem oferecer serviços opcionais.
Em relação à bagagem de mão, a agência ressalta que todo passageiro tem direito a uma franquia de, no mínimo, 10 quilos, nos termos da Resolução Anac n° 400/2016. "Contudo, o transportador poderá restringir o peso e as dimensões da bagagem de mão por motivo de segurança ou de capacidade de aeronave", acrescenta o comunicado da Anac.
O Procon do Rio Grande do Sul já identificou essa situação, como relata o diretor-executivo do órgão, Rainer Grigolo:
- A Anac é a regulamentadora do sistema e tem um entendimento de que seria permitida essa cobrança de uma espécie de embarque premium, do consumidor poder adquirir, a partir de uma taxa, um embarque prioritário, para utilizar os compartimentos de cima sem a necessidade de despachar a bagagem.
Contudo, Grigolo lembra que os grupos prioritários estabelecidos por lei não podem ser cobrados e que nenhuma outra pessoa pode embarcar antes deles.
A advogada e diretora jurídica do Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte (IDC), Renata Abalém, reforça que o que pode ser vendido pelas companhias aéreas é a acomodação prioritária, como no caso da Latam.
- Evidentemente que o consumidor, estando com sua bagagem, vai, a partir do momento em que entrar, acomodá-la. O que não pode é vender um lugar para essa bagagem de mão, seja prioritário ou não - explica.
No comunicado emitido pela Anac, o órgão destaca ainda que todas as empresas aéreas estão cadastradas na plataforma consumidor.gov.br, na qual os passageiros que enfrentam problemas podem registrar reclamações.
Crítica
Para o diretor de relações institucionais do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Igor Britto, no entanto, a Anac, que tem o papel de regular a relação entre companhias aéreas e consumidores, tem sido "bastante omissa" a respeito do que as empresas podem cobrar.
- Não temos, no Brasil, nenhuma norma que trate de programas de fidelidade e milhagem, o que torna ainda mais aberto para as companhias aéreas criarem novos serviços, privilégios e cobranças - afirma Britto, em nota.
FERNANDA POLO
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