Também me declaro culpado como o turista americano que tentou salvar um filhote de bisão num parque de Wyoming, em maio passado. Como foi amplamente noticiado, o episódio acabou num tribunal. E Clifford Walters - esse é o nome do cara - foi condenado a pagar uma multa de US$ 500 (cerca de R$ 2,5 mil), além de prestação de serviço comunitário. Quase foi em cana.
Qual foi o seu crime? Ele tocou num animal do parque, desrespeitando as regras que obrigam os visitantes a manter uma distância superior a 20 metros de alces, bisões e veados. De acordo com seu depoimento, foi por uma boa causa: o animalzinho estava prestes a se afogar depois que a manada atravessou o rio e ele ficou para trás. Walters foi até lá e empurrou o bicho para terra firme.
Deu zebra, para ficarmos com uma metáfora apropriada ao caso. A família do bizãozinho não quis mais saber dele porque ficou com cheiro humano. Pelo jeito, não somos bem-vistos no mundo dos bovídeos - o que não é de admirar, pois há séculos os exploramos com trabalhos forçados e os devoramos. Pior, julgamo-nos no direito de decidir se eles devem viver ou morrer. O filhote salvo da água, por exemplo, foi sacrificado pelos funcionários do parque depois que a manada o rejeitou. Os humanos concluíram que, sozinho, ele poderia ser atropelado ou morrer de fome - e optaram pela bisãotanásia.
Se eu estivesse lá, certamente me oporia ao sacrifício. Outro dia tirei um beija-flor das garras da gata lá de casa - e aqui já estou confessando o meu crime. Sei que se tratava de um ato natural entre predador e presa, mas me sentiria um psicopata se ficasse pacificamente assistindo sem interferir. Acabei pegando o pássaro na mão até que ele se recuperasse do ataque e partisse num voo tresloucado.
Achei que tinha feito uma grande coisa, mas agora, depois de ler sobre o incidente de Wyoming, comecei a me sentir culpado, pensando que o beijador pode ter sido rejeitado pela família por causa daquele contato humano. O que é certo é que a gata não me perdoou até hoje por ter tirado o seu brinquedinho voador.
Afinal - agora encaminhando este texto para uma conclusão séria -, devemos interferir nas leis ancestrais da natureza? Os cientistas dizem que a predação, embora cause a morte de alguns indivíduos, acaba sendo benéfica para as presas, pois evita superpopulação e autoextermínio por falta de alimentos. Ainda assim, penso que temos certa legitimidade para meter o bedelho nas tretas animais, pois também fazemos parte da natureza. O problema é esse nosso cheiro inconfiável.
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