16 DE JUNHO DE 2023
CARPINEJAR
Alfabetização das traças
Por quanto tempo você suportaria a demora da entrega de uma encomenda em sua casa? Uma semana, duas semanas? Depois de um mês, aposto que já entraria em parafuso, ligando para o fornecedor e exigindo seus direitos.
Agora, tente entender o que significa escolas municipais, com déficit de infraestrutura para o ensino, simplesmente não receberem o que já foi adquirido em licitações pela prefeitura por quase um ano.
Ainda mais tendo consciência de que se trata de dinheiro público, de nosso erário, resultado dos nossos impostos e arrecadação. Pois é o que vem ocorrendo na Secretaria Municipal de Educação (Smed). É tão inexplicável que a vontade, ironicamente, é chamar um exorcista para cuidar do almoxarifado. Porque deve ser obra do sobrenatural.
De acordo com série de reportagens do grupo de investigação de GZH, livros, kits pedagógicos e chromebooks, no valor de R$ 100 milhões, encontram-se estacionados em galpões do município. Mofando, literalmente.
As compras foram feitas pela Smed no decorrer de 2022, e não foram alcançadas para os alunos. Não sei se existe algum projeto pioneiro em vigor de alfabetização das traças. É um escândalo de inércia. Uma falha de logística que poderia ser facilmente sanada, mas que vem prejudicando seriamente o futuro de estudantes.
São porões do desperdício, hangares ociosos, com equipamentos que se desatualizam a cada ano que passa. Há aparelhos de ar-condicionado estocados nas escolas municipais, que não podem ser usados por falta de fiação elétrica. Como você compra aparelhos antes de arrumar a rede de energia? Por não cobrir o conserto de um eletricista, arca-se com um prejuízo infinitamente maior.
Itens esportivos e recreativos, procedentes de novembro de 2022, ao custo de R$ 808 mil, choram de abandono em caixas de papelão, armazenados num galpão no bairro Navegantes, em Porto Alegre. São tabelas de basquete, kits com raquetes, bolas, suporte e rede, mesas de pingue-pongue, jogos de frescobol e conjuntos de minitraves de futebol. Nenhum dos acessórios chegou ao seu destino. Noventa e oito colégios municipais vêm perdendo incremento em suas canchas e aulas de educação física.
Qual é o problema da gestão do governo municipal, que compra e não repassa, que dispõe de recursos e não distribui? Sempre existiu burocracia para licitar e adquirir material escolar, mas nunca tinha visto burocracia para entregar.
Não está sendo discutida, em nenhum momento, a regularidade das compras, porém a demora e ineficácia risíveis em atender a rede de ensino. A impressão é de que podemos esnobar recursos, que está sobrando verba a ponto de forrar a despensa, de comprar além do necessário.
Não é verdade. Bem conhecemos a situação precária das escolas. Uma delas, na Zona Norte, conta com 24 aparelhos de ar-condicionado guardados. Já estão quase virando pufes para se sentar. Somos campeões em licitações, verdadeiros fracassos no repasse do estoque.
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