OPINIÃO DA RBS
MARCO TEMPORAL E CRISE AMBIENTAL
Assim como não era só por 20 centavos a insatisfação popular da jornada de junho de 2013, movimento que está completando 10 anos, também não é apenas pelo resgate de uma dívida histórica com os povos originários que o país debate apaixonadamente a implantação do marco temporal de terras indígenas. Há muitos interesses, todos legítimos, em jogo, mas duas metas prioritárias devem ser perseguidas por parlamentares e ministros do Supremo Tribunal Federal que avaliam a questão: a garantia de paz e justiça social nas áreas sob litígio e a preservação ambiental das florestas nacionais.
Tais propósitos podem parecer inalcançáveis diante do radicalismo que vem sendo demonstrado pelas partes em conflito, o que ficou evidenciado na recente votação do PL 490 no Congresso Nacional, já com aprovação na Câmara e prestes a ser avaliado pelo Senado. Houve, sem dúvida, excesso de politização e de ideologização de um tema que exige o máximo de pragmatismo. Mas a democracia sempre possibilita alguma saída sensata para impasses intrincados.
Em paralelo ao debate parlamentar, o STF também examina o problema sob o foco da legitimidade constitucional e com a perspectiva de acelerar uma tomada de decisão. Nesse contexto, preocupa a interrupção temporária do julgamento devido ao pedido de vista do ministro André Mendonça, que retarda inexplicavelmente uma decisão aguardada ansiosamente pelo país e acompanhada com atenção pela comunidade internacional.
O marco temporal é uma tese jurídica defendida pelos representantes do agronegócio e rejeitada por ambientalistas e organizações de defesa dos povos originários. Em síntese, o projeto considera a data de promulgação da Constituição Federal brasileira, 5 de outubro de 1988, como marco jurídico para o reconhecimento de direito sobre os territórios indígenas - desconsiderando ocupações ilegais por madeireiros, produtores rurais e mineradores que, em muitos casos, provocaram migrações forçadas dos antigos habitantes das terras. Já os ruralistas argumentam que a nova legislação trará segurança jurídica para o agronegócio brasileiro, protegerá investimentos num setor fundamental da economia e evitará que trabalhadores rurais de extensas áreas produtivas, instalados há várias gerações em suas propriedades, sejam removidos devido à pressão de movimentos sociais.
Independentemente da decisão que vier a ser adotada pelos poderes constituídos, o Brasil não pode abrir mão de seus compromissos com o respeito à vida e à cultura dos seus habitantes originários, com a proteção do meio ambiente e de áreas florestais indispensáveis para o ecossistema do planeta e também com os direitos adquiridos por quem trabalha honestamente para o progresso nacional.
Um desafio desta dimensão só pode ser equacionado com sabedoria e sensatez. É urgente uma tomada de decisão, mas sem que isso comprometa a paz social, gere novos conflitos e transforme o país em vilão ambiental.
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