01 de dezembro de 2015 | N° 18372
POLÍTICA
SOB SUSPEITA DE DESVIOS, JARDEL É AFASTADO
JUSTIÇA ACATOU PEDIDO DO MP e, pela primeira vez, um deputado está proibido de cumprir suas funções
No dia em que a Assembleia Legislativa se preparava para anunciar boas notícias – como a da economia decorrente da revisão de contratos –, o parlamento acabou imobilizado pelo cumprimento de busca e apreensão em um gabinete e pela decisão inédita da Justiça mandando afastar um deputado das funções. Foi assim que a Operação Gol Contra, do Ministério Público (MP), tomou o Palácio Farroupilha a partir das 9h de ontem, tendo como principal investigado o ex-jogador e deputado estadual Mário Jardel (PSD).
As suspeitas são de crimes como concussão, peculato, falsidade documental, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Também é investigado o possível financiamento ao tráfico de drogas com dinheiro público desviado do parlamento. Para quem recém acompanhou notícias envolvendo o deputado Diógenes Basegio (PDT), que foi acusado pelo MP de desviar verbas do parlamento, renunciou ao mandato e foi posteriormente cassado, pode parecer que se trata das mesmas coisas. Quase uma reprise.
É mais ou menos isso que o chefe de gabinete de Jardel, Roger Foresta, diz em uma ligação que foi gravada com autorização judicial: “É, aquilo que aparece na TV é isso aí mesmo. Todos iguais”. No diálogo, Foresta, que também é investigado pelo MP, reclama por ter de entregar R$ 4 mil de seu salário para quem ele chama de “sócio”. Para os promotores, o “sócio” é Jardel.
Com coordenação da chefia do MP, equipes do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) fizeram buscas no apartamento e no gabinete do deputado, além de vasculhar endereços de outros investigados. Para executar as ordens judiciais no parlamento, o procurador-geral de Justiça, Marcelo Dornelles, esteve reunido com o presidente da Casa, deputado Edson Brum (PMDB). O anúncio da operação causou corre-corre no Legislativo. Procuradores do parlamento foram chamados às pressas para reunião na presidência. Quando foram iniciadas as buscas no gabinete de Jardel, no 11º andar da Assembleia, o acesso da imprensa ao local foi fechado.
No apartamento do deputado, localizado em um condomínio nas proximidades do Parque Germânia, uma equipe do Gaeco fez buscas durante quase duas horas e recolheu documentos, celulares e duas buchas de cocaína. Quando os policiais entraram, o deputado pediu para chamar o advogado. Enquanto o mandado de busca era cumprido, o parlamentar, que teve o telefone grampeado durante a investigação, manteve-se calado, segundo pessoas que acompanharam o trabalho.
BRUM DIZ QUE LEGISLATIVO TEM APRIMORADO CONTROLE
Como a droga apreendida era de pequena quantidade, Jardel teve de assinar um termo circunstanciado por posse de entorpecente, e o material foi recolhido. Também foram apreendidos os celulares do deputado e da mulher dele, além de documentos que possam comprovar pagamentos irregulares de despesas do casal com dinheiro de assessores.
A investigação, que durou dois meses, apurou indícios de que Jardel exigiria percentuais dos salários dos funcionários de seu gabinete e da bancada do PSD e fraudaria diárias de viagem e valores de indenização veicular, além de manter supostos funcionários fantasmas no gabinete. Com o esquema, ele lucraria entre R$ 30 mil e R$ 50 mil mensais. Até o aluguel do apartamento em que vivem a mãe e um irmão do ex-jogador seria pago com dinheiro extorquido dos funcionários.
Para que ninguém fique com a sensação de que se fala sempre do mesmo tipo de fraude no parlamento, o presidente da Casa ressaltou:
– A Assembleia tem aprimorado os sistemas de controle. O problema é de conduta. A maioria das pessoas trabalha muito, com muita honestidade e responsabilidade. Se alguém pratica desvios, tem de pagar a conta. Somos 55 deputados e todos trabalham. Se um tem desvio de conduta, que pague.
Brum não quis comentar o teor das acusações. Pesa no rol contra Jardel a suspeita de financiamento de tráfico de drogas com dinheiro público, essa sim, uma novidade em relação a outras irregularidades que já vieram à tona na Assembleia. O MP suspeita que Jardel pagava drogas por meio do salário de uma suposta funcionária fantasma. O advogado de Jardel e também funcionário do gabinete, Christian Vontobel Miller, disse que o deputado “rechaça” todas as acusações. Miller está entre os investigados da Gol Contra. Até o momento, Jardel e mais 11 pessoas estão sob investigação. Os depoimentos começam a ser tomados hoje, no MP.
adriana.irion@zerohora.com.br juliano.rodrigues@zerohora.com.br
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