sábado, 26 de julho de 2008


Dagomir Marquezi

Personagem da semana - Christian Bale Com mil salas multiplex, "Batman"!

Na tela, o ator vive O Cavaleiro das Trevas, o sucesso da temporada. Na vida real, foi detido por agredir a mãe

CAMPEÃO

Bale como Batman – o Cavaleiro das Trevas. O filme bateu a bilheteria do Homem-Aranha na estréia. Desde os anos 1940 somos convidados a entrar na batcaverna. E não saímos mais.

Hoje, novas (e velhas) gerações ficam acachapadas por duas horas e meia na poltrona do cinema assistindo a Batman – Cavaleiro Das Trevas. Em quatro dias de exibição, o filme (que custou US$ 150 milhões para ser produzido) já faturara US$ 244 milhões mundo afora.

Nem é preciso ser o secretário das finanças de Gotham City para imaginar que sua versão em DVD/BluRay será um dos presentes mais cobiçados do Natal.

O “dono” da batcaverna hoje é o britânico Christian Charles Philip Bale, filho de um militar com uma palhaça – o que, de certa forma, explica sua mistura de ousadia artística com tamanha disciplina. Bale pensou em ser dançarino, guitarrista e jogador de rúgbi.

Mas começou sua vida profissional onde muitos esperam terminar. Atuou aos 13 anos sob a direção de Steven Spielberg em Império do Sol. Depois se aventurou por Shakespeare, por musicais e arriscou-se com sucesso no perturbador Psicopata Americano.

Emagreceu até virar um pele e osso em O Operário. Sua escolha como o Batman do renascimento pode ter sido uma das melhores jogadas da série. Aos 34 anos, Bale dá completa credibilidade a tudo o que faz. Seu homem-morcego espanca covardemente o desarmado vilão Coringa numa cela.

Nem bem o filme é lançado, Bale foi acusado de agressão pela própria mãe e pela irmã. Na segunda-feira passada, foi detido em Londres pela polícia. Pouco depois foi libertado e deverá ser chamado para prestar mais esclarecimentos.

O potencial escândalo não arranhou 1 milímetro o prestígio de Bale nem a bilheteria de Cavaleiro das Trevas. Bale tem crédito para queimar por seus serviços como ator.

Tanto que deverá interpretar mais dois heróis míticos na seqüência: John Connors (na seqüência de O Exterminador do Futuro) e Robin Hood (em Nottingham). A gente acredita em tudo o que ele fizer. Cavaleiro das Trevas é mais que um sucesso absoluto. Virou fenômeno.

Com tanto som e tanta fúria em Dolby Digital, fica difícil acreditar que a lenda pessoal do playboy Bruce Wayne vai completar 70 anos no ano que vem.

E mais difícil ainda acreditar que a gente ainda leve a sério um sujeito que persegue malfeitores com uma roupa de mergulhador, capacete de orelhinhas e uma capa esvoaçante. Pois pagamos para ver.

Batman veio ao mundo na revista Detective Comics, edição de maio de 1939, em quadrinhos de Bob Kane. Todo mundo sabe: Bruce Wayne é um garoto rico que testemunha seus pais serem mortos por ladrões, enquanto morcegos sobrevoavam o local. Para suportar a perda, Bruce decide alternar a vida de playboy filantropo com a de justiceiro, meio drácula.

Quatro anos depois de surgir no papel, Batman já era um seriado de cinema. O ator Lewis Wilson foi o primeiro homem-morcego. Na década de 1950, a revista foi criticada por quem não gostava da intimidade entre Batman e seu protegido e parceiro adolescente, Robin. Eles dormiam na mesma cama.

‘‘A cidade de Gotham City é um patrimônio cultural da humanidade’’

Nos anos 1960, Batman virou mania mundial, como série cômica de TV. Adam West vestia o ridículo colante cinza e conseguia levar a sério seu personagem. (Em 1966, um longa-metragem foi produzido no mesmo esquema.)

A série se tornou uma referência pop. A lenda do homem-morcego sobreviveu ao próprio esculacho. Foi ressuscitado nos gibis – especialmente por Frank Miller – com uma releitura mais adulta, sombria e pesada.

O mesmo herói que nos fazia rir na tela de TV passou a beirar a loucura e enfrentar problemas existenciais. Nessa nova perspectiva, voltou ao cinema em 1989, com o improvável Michael Keaton por trás da máscara. Ele não tinha cara nem físico de super-herói. Mas vestiu a batcapa com convicção.

A ousada tacada do diretor Tim Burton foi um sucesso. O Batman do cinema chegou ao indiferente Val Kilmer, em Batman Forever, de 1995. Sucumbiu dois anos depois ao homem-morcego-com-mamilos de George Clooney (em Batman & Robin).

Com mil salas multiplex, Batman! Quando a batcaverna parecia ter sido soterrada para sempre, foi reaberta, em 2005, com Batman Begins, sob direção do enfant terrible de Hollywood Christopher Nolan.

Para as gerações mais novas, Batman tem a cara de Christian Bale. Michael Caine é seu fiel mordomo Alfred. E nada de Robin. Nada de gracinhas e insinuações gay. Você assiste a Cavaleiro das Trevas e nem parece ser um “filme de super-herói”.

Às vezes sugere um drama adulto, outras um filme de terror ou nosso noticiário de cada dia. O Coringa de Heath Ledger continua sendo um palhaço, como já foram Cesar Romero e Jack Nicholson.

Depois do gigantesco sucesso de Cavaleiro das Trevas, uma continuação é questão de mais dois ou três anos.

Batman, na pele de Christian Bale, está completamente renovado, em forma para a década de 2010. Certas coisas continuarão difíceis de engolir – como a total incompetência da população de Gotham City em descobrir a identidade secreta de Batman.

Mas Christian Bale acredita completamente no que está fazendo, como acreditou em cada um dos papéis que interpretou antes. Sua credibilidade virou uma espécie de aval para a lenda de Bruce Wayne.

Hoje, na prática, Gotham City é patrimônio cultural da humanidade. Somos todos um pouco batmans: cumprimos nosso papel social como “brucewaynes” durante o dia e somos donos da verdade na sombria noite de nossa psique.

O Coringa zomba de nossos planos, e suas gargalhadas insanas ecoam num canto escuro de nossa mente.

As acusações da mãe e da irmã contra Bale são apenas mais uma prova de que, neste nosso novo mundo de Batman, ninguém é super-herói.

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