sábado, 26 de julho de 2008



26 de julho de 2008
N° 15674 - Nilson Souza


Barbudos

Uso barba desde os tempos de faculdade e por causa dela já passei por pequenos constrangimentos, como no dia em que um dos meus sobrinhos, com três ou quatro anos de idade, olhou fixo para o meu rosto durante algum tempo e perguntou:

- Tio, tu tem queixo?

Essa foi fácil de responder. Bem pior foi o que aconteceu com a tia de uma amiga, avó ainda relativamente jovem, que ouviu esta pergunta fulminante de sua netinha:

- Vó, tu conheceu dinossauro? Surpreendida, ela retrucou: - Cala a boca, menina!

Mas as crianças a gente enrola. Com adulto é mais difícil. Uma vez, no tempo em que usava uma barba pré-histórica, grande e mal aparada, fui jogar futebol de salão e resolvi esperar os companheiros de time sentado na escadaria de uma igreja.

Vestia uma calça de abrigo antiga, uma camiseta de jogo também meio surrada e tênis desamarrados. Passou um sujeito e me ofereceu uma esmola. Quando disse que não queria, ele se indignou: - Orgulhoso, hein?

Culpa da barba. Além de envelhecer, os pêlos escondem a verdadeira fisionomia do seu portador. Agora mesmo, todos vimos espantados a transformação que sofreu o ex-presidente da Sérvia. Acusado de crimes de guerra, ele passou mais de 10 anos escondido atrás da própria barba.

Mudou de rosto, falsificou a identidade e sequer precisou fugir do país. Ficou tão diferente, que era visto por seus próprios patrícios como outra pessoa - um pacato e inofensivo idoso, praticante de medicina alternativa.

O episódio reforçou a minha impressão de que os barbudos sempre escondem alguma coisa mais, além do próprio rosto. Às vezes, coisas assustadoras, como o passado do governante sérvio. Outras vezes coisas inocentes, como uma timidez mal resolvida.

Mas não merecem ser vistos preconceituosamente, como fez um conhecido especialista em economia e política que andou por estas paragens no início de 2002 e sentenciou uma solene previsão sobre a terceira candidatura do petista Lula:

- Ele jamais será eleito. A população brasileira não confia em candidato de barba.

Dou mais uma dica sobre o desastrado previsor, que ainda dá os seu palpites na TV: ele não usa barba. Nós, os barbudos, temos pelo menos uma virtude: estamos sempre aptos a surpreender.

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