08 de fevereiro de 2017 | N° 18763
MARTHA MEDEIROS
The Brothers
“O documentário faz a gente se reapaixonar pelos Beatles”, escutei alguém dizer, e eu que não estava pensando em assistir a Eight Days a Week por preguiça e presunção de que já sabia tudo, corri para o cinema e confirmo: sim, o documentário faz a gente se reapaixonar pelos Beatles sem remorso por estar chovendo no molhado.
Nada de fofocas, dramas, romances. O objetivo do filme é registrar as turnês da banda, desde os primeiros shows no Cavern Club, em Liverpool, até as apoteóticas apresentações nos maiores estádios do mundo, culminando com a última, em 1966, em San Francisco. Quatro meninos de 17 anos que começaram a tocar por diversão e que não pararam de se divertir nem mesmo quando se transformaram nos ícones absolutos da cultura pop. O segredo: convivência intensa, muita risada e o lema dos mosqueteiros: todos por um.
A primeira providência de Brian Epstein, o classudo empresário da banda, foi mandar fazer ternos idênticos para John, Paul, George e Ringo, e dali por diante eles passaram a ser um só: “Um monstro de quatro cabeças”, como brincavam entre eles. Era um grude: dormiam sob o mesmo teto, faziam as refeições juntos e nada era decidido se os quatro não estivessem de acordo. Em meio a entrevistas, não perdiam a piada. O sucesso veio rápido e a gaiatice continuava. Era uma turma de colégio, uma gangue de rua: os The Beatles eram também The Brothers.
Até que o prazer deixou de ser essa coisa toda. Quando começaram a fazer shows colossais, não conseguiam mais escutar um ao outro no palco – cortesia do público gritante. Passaram a se sentir inseguros e cansados. Chegaram a fazer 90 cidades em 15 países numa única turnê. Sua juventude foi consumida pela beatlemania e um dia se viram adultos participando de um circo que não divertia mais:
“Fecharam o boteco”, como diz um amigo, e voltaram para o estúdio, onde praticamente inventaram uma banda nova (ainda mais extraordinária) a partir do antológico álbum Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band. Só três anos depois do jejum de shows, é que voltaram a cantar em público, de surpresa, no terraço do prédio da Apple Records, em Londres, para alguns sortudos desavisados que estavam passando lá embaixo a caminho da padaria.
E foi seu réquiem: no mesmo ano, a banda se desfez.
Desfez em tese, porque é um fenômeno vitalício. Os Beatles não se pareciam com nada que havia surgido antes e jamais foram igualados depois, apesar das boas tentativas. A maior banda do planeta nunca teve mais do que dois roadies por show. Nada de telões. MTV. Redes sociais. Entraram para a História simplesmente pelo exagero de talento e carisma: sobrava para uma semana de oito dias. Faça de conta que não sabe nada disso e corra para o cinema para ter certeza outra vez.
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