sábado, 9 de abril de 2011



09 de abril de 2011 | N° 16665
PAULO SANT’ANA


Paraíso e inferno

Impressiona, no massacre das crianças na escola do Rio de Janeiro, o que se passava no cérebro do atirador assassino.

Num dos dois hemisférios do cérebro do assassino, ele guardava a sanha sanguinária. Só queria saber de matar. E, quanto mais inocentes fossem suas vítimas, melhor para sua sanha.

Já no outro hemisfério do cérebro do assassino, desenvolvia-se um notável senso de organização: ele comprou munição adequada para seus revólveres, observou com atenção a movimentação na escola por diversas vezes, cuidou dos horários do colégio, anteviu que ia enfileirar as crianças antes de matá-las, por força de suas ameaças, calculou até que depois de balear as crianças de um andar iria subir mais um piso e matar outras.

Ou seja, um hemisfério do cérebro completamente avariado, doente. O outro saudável e raciocinante.

Não sei o que mais dizer dessa chacina inominável. Essas tragédias intencionais não são diferentes dos terremotos e outras tragédias naturais. Deixam-nos embasbacados, sem sabermos o que dizer.

O que talvez ainda dê para dizer é que esse atirador assassino do Rio de Janeiro não queria fama. O centro primal do seu planejamento era o próprio suicídio. Ou seja, ele não queria “saborear” a popularidade do seu gesto, iria morrer logo em seguida à catástrofe. Não a construiu para curtir os noticiários de televisão e de jornais.

Treinou-se para matar muitas pessoas e para matar-se.

E fez tudo de forma rigorosamente perfeita.

Agora, teme-se que outros loucos venham no futuro a imitar esse maníaco no Brasil.

O pior desse atentado, principalmente para pais de crianças cariocas, é que, sempre que, daqui por diante, mandarem suas crianças para a escola, estarão possuídos de um pré-terror, um remorso, um ansioso comedimento.

Que maldição é essa que faz do Rio de Janeiro a cidade mais bonita do mundo, no entanto tingida de sangue pelas guerras do tráfico, pelo enfrentamento dos traficantes com a polícia, agora por esse crime monstruoso da escola do Realengo?

Como pode aquela beleza natural carioca abrigar tanto sangue derramado pelo crime? Como pode uma cidade tão musical, tão romântica, tão poética, ser ao mesmo tempo a mais violenta e a mais sangrenta do país?

Como pode o carioca, tão bem-humorado e cheio de gracejos, ter de quase todos os dias calar-se para respeitar as mortes que espocam em seus subúrbios e favelas?

O Rio foi presenteado ao Brasil pela natureza.

Mas quase todos os dias ele se torna um inferno.

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