terça-feira, 26 de abril de 2011



26 de abril de 2011 | N° 16682
LUÍS AUGUSTO FISCHER


Não se dá o respeito

Expressões populares, como a do título, costumam ter mais de uma encarnação. Agora, por exemplo, circula com liberdade a frase “Tô pouco me lixando”; a confiar na minha memória, essa formação resulta da fusão de duas anteriores, “Tô pouco me ligando” e “Tô me lixando”, ambas significando aproximadamente a mesma coisa, “Não tô nem aí”, mas cada uma com um centro: “tô pouco me ligando” declara desligamento de dentro pra fora, ao passo que “tô me lixando” declara pouco-caso pelo lado de fora, o lado lixável.

Para mim, a frase “Tô pouco me lixando” não forma o sentido que gostaria de formar, ou é irremediavelmente paradoxal? Mas eu posso ser o único a reparar nisso e portanto a observação resultar inútil.

Por outro lado, o atento leitor já deve ter ouvido que fulano “não se dá ao respeito”, em lugar de “não se dá o respeito”. Por razões de regência e clareza, prefiro esta última: ao fazer grossa bobagem, o fulano em causa não dá a si mesmo o respeito que quer receber dos outros. Assim ocorreu com o presidente da Academia Brasileira de Letras, neste mês que está por findar.

O senhor em causa se chama Marcos Vilaça e protagonizou, não sei se por conta e risco próprios ou se com apoio de mais, hummm, acadêmicos, uma cena que seria patética se a Academia ocupasse por mérito o lugar que ocupa na vida brasileira por decreto, por anacronismo e por leniência nossa.

É que, conforme noticiou a Folha de S. Paulo (12 de abril, caderno Esporte, página D7), por sua mão a Academia agraciou dois homens com a sua mais alta comenda, a Medalha Machado de Assis; os dois homens são Ronaldinho, dito Gaúcho, e Vanderlei Luxemburgo.

(No ano passado, Joel Santana, outro técnico de futebol, ganhou a mesma medalha.) Perguntado sobre seu livro predileto, o atleta declarou, firme e forte: “Não tenho”. Acrescentou que aproveitaria a visita para pedir dicas de livros para aqueles ilustres ali.

Sei que a sessão era uma homenagem a José Lins do Rego, escritor e flamenguista, o que justifica adequadamente a Medalha Joaquim Nabuco dada ao clube Flamengo (recebeu-a a presidente, Patrícia Amorim); aqui estamos no terreno das honrarias formais cabíveis.

Mas e as outras medalhas? Nada tenho contra o elogio público a atletas de futebol ou de outros esportes; o que me parece uma bobagem irrecuperável é dar a eles a Medalha Machado de Assis. A habilidade de Ronaldinho com os pés (e a de seu irmão empresário com a lábia e os números) o tirou do convívio com a literatura, que ele agora desdenha vivamente, com o aplauso quase abjeto dos acadêmicos que lhe prestaram a homenagem.

Um comentário:

NetoGoulart disse...

Aqui no Rio Grande Amado existe uma expressão -


Que barbaridade!!!!