terça-feira, 24 de março de 2009


ELIANE CANTANHÊDE

"Pobre ignorante"

BRASÍLIA - Enquanto Obama reconhece a legitimidade do plebiscito pró-Chávez na Venezuela e acena com lenço branco e gravação amistosa até para o Irã, líder do "eixo do mal" de Bush, o que faz o próprio Chávez? Engrossa a voz e vai trocando de inimigo, do "el diablo" Bush para o "pobre ignorante" Obama.

Além da retórica, a ação. Chávez mantém a expulsão do embaixador norte-americano em Caracas e acaba de convocar uma reunião da Alba exatamente às vésperas da Cúpula das Américas, que reunirá presidentes de todo o continente em Trinidad e Tobago, de 17 a 19 de abril, e será a estreia de Obama no meio de Chávez e outros muy amigos entre si e muy inimigos de Washington.

A Alba (Alternativa Bolivariana para as Américas) é uma contraposição à falecida Alca e foro de confronto aos EUA. Ou seja: a reunião que Chávez convocou agora não é apenas para tricotar, mas para já preparar os espíritos e os desaforos contra o "império". Os ataques de Chávez no front externo têm um alvo interno.

A Venezuela vive do petróleo, que sofre queda de demanda e preço. O barril, que chegou a quase US$ 150, já está em torno de US$ 50. Ele precisa do inimigo comum para manter popularidade. Aliás, nada mais manjado.

Chávez também toma providências que arrepiam o mundo, quando deveriam arrepiar principalmente os venezuelanos, a caminho se serem "pobres ignorantes" ou "ignorantes pobres".

Chávez assumiu o controle de portos, privatiza bancos e empresas, prepara-se para uma guerra. Liquida assim as chances de investimento externo na Venezuela, simultaneamente às perdas com o petróleo. Boa coisa não dá.

Isso projeta uma reunião tensa em Trinidad e Tobago, mas, para Lula, nada poderia ser melhor. Quanto mais Chávez ataca, mais ele defende. E é assim que vai consolidando a imagem de líder moderado, capaz de "amansar a fera". Desta vez, para Obama ver.

elianec@uol.com.br

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