Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
terça-feira, 14 de outubro de 2008
14 de outubro de 2008
N° 15758 - PAULO SANT’ANA
O estoque de esperança
Com a proximidade do Dia do Médico, homenageio esta categoria profissional que tantos serviços tem a mim e a nós prestado com uma crônica do cirurgião José J. Camargo alusiva à data:
“Meu caro colega, você pode ser, como eu, avesso às datas comemorativas, porque elas são aleatórias e quase sempre, por alguma estranha ironia, coincidem com uma fase em que não temos vontade de comemorar coisa nenhuma. Mas hoje vamos dar um tempo nessa agitação insana e refletir um pouco sobre o que somos, o que sonhávamos e o que não desistimos de conseguir.
Esqueça o teste vocacional, apague as pressões familiares e tente lembrar quando você decidiu ser médico, não importa há quanto tempo tenha sido.
Provavelmente, a reminiscência mais antiga estará na infância, quando você acolheu um cão de rua e se comoveu com o olho agradecido dele ou quando, com as mãos trêmulas e desajeitadas, tentou consertar a perna quebrada de um pássaro ferido e ficou impressionado com a naturalidade com que o pequeno animal se entregou.
Passados esses anos, sabemos todos que o prazer original de ajudar segue inalterado, não importa o que pensam os burocratas, que pretendem nos ensinar como devemos ser médicos mais adequados aos modelos econômicos e administrativos, que buscam equiparar os nossos hospitais às empresas mais modernas.
Mas hoje vamos nos esquecer deles porque seria demais esperar que, obcecados pelos números, eles pudessem entender que existe uma alegria insuspeitada e uma cumplicidade quase divertida no abraço agradecido do paciente mais simples que se sentiu tratado como gente, mesmo que a conta tenha sido glosada.
É verdade que o mercado se tornou muito competitivo, e as condições de trabalho para muitos de nós se fizeram progressivamente mais hostis, com o médico servindo freqüentemente de escudo de um sistema de saúde que constrange o profissional, agride o paciente e avilta o ser humano.
Também não se pode negar que o horizonte não promete melhoras, a julgar pelo vazio dos discursos eleitoreiros, que banalizam as palavras cidadania e dignidade, e na ação revelam que não têm a menor idéia do que elas significam.
Mas, apesar de tudo, admita que ser médico é muito bom.
Porque ser médico leva-nos a descobrir muito cedo que a relação pessoal, com quem está assustado pela fantasia da morte, tem uma intensidade que os outros profissionais nem sequer suspeitam, e nos dá a chance de conhecer pessoas, rápida e profundamente, e crescer com os pedaços de alma que cada uma delas oferece em troca da ajuda desesperada.
Não sei bem de onde vem tanto encanto, mas é provável que uma grande parte dele esteja na função de preservar a esperança, e, certamente, se sentir instrumento dessa esperança que renova a alegria de ser médico todos os dias, sem pausas para o fim de semana, nem senhas de acesso a emoções pela metade.
Um dia, tentando explicar a um médico que sua jovem esposa não era candidata a um transplante de pulmão, porque coração e rins estavam também destruídos por lúpus, recebi dele um pedido dramático e uma grande lição:
“O senhor não está entendendo. O que eu lhe imploro é que ela seja admitida numa lista de espera fictícia, porque eu não suporto mais conviver com o desespero do olho dela, sabendo que está morrendo um pouco a cada dia, e que eu não estou fazendo nada para mudar isso. Tudo o que eu lhe peço, meu caro doutor, é um transplante de esperança!”
Nesse dia aprendi que a morte da esperança é a mais definitiva de todas as mortes, mesmo que a pobre carcaça do que fomos continue caminhando por aí. Dissimuladamente!”.
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