sábado, 17 de novembro de 2007



17 de novembro de 2007
N° 15421 - Ricardo Silvestrin

É um pássaro, é um avião? Não. É a polícia

Estávamos chegando em casa.

Ao descer do carro, minha esposa apontou para o céu, mostrando ao nosso filho de 10 anos um helicóptero que estava parado no ar. Para nós, os pais, crianças da década de 60, um helicóptero, um avião, eram motivo de alegria. A gente até abanava para eles.

Mas meu filho, uma criança de hoje, perguntou: será que não é a polícia? E era. Entramos em casa, e a TV e o rádio cobriam uma ação policial numa vila, com alguém que estava deixando uma família como refém. O helicóptero fazia parte da busca.

Assistíamos, quando pequenos, na TV, ao Batman. Aquele ser com uma leve barriguinha, envolto por uma malha lilás, capturava um a um os bandidos. Pingüim, Charada, Coringa, Rei Tuti, Cabeça de Ovo, todos muito criativos.

Eram personagens bem mais interessantes do que a dupla dinâmica. Hoje, a piazada degola meio mundo nos videogames. A brincadeira sempre serviu para sublimar. As ameaças precisam ser domadas pelo jogo com elas.

Os bandidos, distantes, na nossa infância, eram motivo de riso. Torcíamos para o Batman sabendo de antemão que ele iria ganhar. Passava no máximo algum trabalho, mas bastava, amarrado, alcançar o batcinto para tirar dali a batcorda e tudo se resolvia.

Hoje, com a violência avançando, a reação, mesmo lúdica, exorciza a golpes, com sangue quase real, o medo. Temíamos o velho do saco, o ladrão que roubou roupas no varal, uma gangue de pivetes.

Hoje, as crianças de classe média estão aprendendo a temer tudo: entrar no carro, sair do carro, abrir a porta, sair para a rua. A arte tenta dialogar com o que ocorre em torno de nós.

Filmes como Tropa de Elite e outros tantos que enfocaram a miséria brasileira, o tráfico, a violência, a corrupção, o jogo de interesses, a concentração de renda, a desigualdade social e por aí vai apontam enfoques, posicionam-se de uma ou de outra forma. Arrancam elogios ou críticas. Mas a arte tem um limite que é inerente a ela: ser arte.

Está faltando à sociedade brasileira discutir a sua realidade. Entregamos o país para os políticos quando pensamos que a democracia era a solução de todos os males. Não é. Sem reflexão de cada um, não tem democracia que resolva.

Sem debate público não tem república. A violência, o engodo, a falta de ética correm por baixo de tudo. Qualquer pilantragem é elogiada com o argumento de que a pessoa ganhou uma grana. Ser desonesto, se deu dinheiro, está liberado.

A sexualidade, o acordo político, a negociata, a bola, o toco, o exibicionismo, a revista frívola, o programa de TV sem cérebro, o apresentador que não gosta do programa que apresenta, o site sensacionalista, o vídeo do youtube, tudo é avaliado pelo seu poder de moeda.

O único valor é ficar rico. Daí se justifica tudo para todas as classes: roubar, sonegar impostos, traficar, trapacear.

No entanto, não passamos de um bando de pelados, com o dinheiro levado pelo cheque especial, pelas empresas de telefonia e de TV a cabo, querendo mais dinheiro para passar adiante, seja para o empresário, para o governo ou para o ladrão. Não há mais heróis. Só vilões.

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