sexta-feira, 30 de novembro de 2007



PRESTAR OU NÃO PRESTAR?

Você vai prestar no ano que vem ou ainda neste?' Foi em Cuiabá que eu ouvi essa pergunta inquietante. Na verdade, eu estava escutando o diálogo de duas moças muito animadas.

Cada região brasileira tem a sua maneira de falar e até o seu humor. Quase em Rondonópolis, onde fui visitar meu irmão e uma sobrinha, há um hotel com um nome sugestivo: Hotel para Chifrudos. Não é, claro, o que alguns já estão pensando. Nem tem, obviamente, qualquer relação de mau gosto com a imigração gaúcha para o Mato Grosso.

É um lugar que se ocupa de bovinos. Mas o que me interessa aqui é a pergunta com a qual eu comecei esta crônica. Acontece que imediatamente eu apliquei a questão a mim. Será que eu vou prestar no ano que vem ou ainda neste?

Como só temos um mês e pouco pela frente, acho melhor fazer como o Grêmio e o Internacional e remeter tudo para o próximo ano.

Aqui está, em primeira mão, a minha promessa de final de ano: em 2008, juro que eu vou prestar.

Ainda não sei como vou fazer para alcançar essa meta louvável e complexa. Prometo, em todo caso, que não pouparei esforços para chegar lá. Evidentemente que tentarei ser bom marido, bom professor, bom cidadão e bom colunista.

Dado, porém, que eu não tenho a possibilidade de reclamar um aumento de impostos para facilitar o meu plano de melhoria existencial, nem jogo na Mega-Sena, só me resta investir com os meus recursos.

Ou nos meus recursos. Não posso negar que 2007 foi um bom ano. Ainda assim, a pergunta feita pela morena continua ecoando na minha cabeça. Confesso que admirei mesmo foi a resposta da loirinha: 'Este ano não pude prestar.

Bem que tentei. Mas não deu mesmo'. A outra mostrou-se generosa: 'É assim mesmo. Tem vezes que a gente acha que vai dar e, infelizmente, não consegue prestar. Este ano, apesar de todo o meu empenho, eu não prestei'.

Eu tenho o maior respeito por essas pessoas que estabelecem objetivos e são capazes de alcançá-los ou de admitir cristalinamente que fracassaram. A palavra não é essa. Certo, parece-me, seria dizer que não atingiram o patamar fixado.

O problema é que as duas moças não paravam de falar em prestar e, sem saber bem a razão, eu comecei a fazer uma análise da minha vida: será que um dia eu prestei?

Prestei mesmo? Será que um dia vou prestar muito? Entrei numa espiral filosófica. As viagens sempre me permitem refletir bastante. Os longos atrasos – sete horas no Salgado Filho antes de embarcar para Mato Grosso – estão melhorando sensivelmente a minha cultura.

Chego a ler mais de 200 páginas. Dependendo do livro, chego a querer que o atraso seja ainda maior. O setor aéreo brasileiro ainda vai receber um prêmio cultural pela sua contribuição para o aumento dos índices de leitura em todo o país.

É feio ouvir a conversa dos outros. Mesmo assim, quase deslumbrado, continuei de ouvido atento ao papo das duas gurias de Cuiabá.

Eu me sentia aprendendo com elas de uma forma simples e eficaz. Por que não teriam prestado em 2007? Tive vontade de me meter na conversa para esclarecer essa minha dúvida. Não tive coragem.

Ou tive educação suficiente para não pagar mico. Eu já me preparava para subir ao palco e fazer a minha palestra na Universidade Federal do Mato Grosso quando a morena foi mais precisa: 'Ano que vem, seja como for, eu vou prestar concurso'.

juremir@correiodopovo.com.br

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