sábado, 17 de novembro de 2007



18 de novembro de 2007
N° 15422 - Paulo Sant'ana


Pirulito de costela

Se você é jovem, não percebe, mas a vida lhe oferece um leque de prazeres. Uns 50 prazeres mais ou menos.

O tempo foi passando e meu círculo de prazeres foi se reduzindo, hoje restam quatro ou cinco somente.

E minha vida se resume ao exercício eventual de um desses cinco prazeres.

Neste verão que se aproxima e que creio será fortemente antípoda ao inverno rigoroso e prolongado que vivemos atualmente, quando o frio ainda estremunha em pleno novembro, eu vou ao encontro de um dos meus cinco últimos prazeres:

ficar sentado debaixo de um guarda-sol, com três ou quatro jornais no assento de uma cadeira de palha, na minha frente uma lâmina de água azul iluminada pelos raios fortes de sol, num bar da Praia do Forte, em Florianópolis. Fico ali durante quatro ou cinco horas, as mais felizes da minha vida.

Claro que o prazer se consagra quando o garçom do bar me traz uma bandeja enorme de grandes camarões frescos, pescados no dia anterior, alho e óleo, inúmeros pedaços de limão, os chopes vão se sucedendo na tarde calma e serena da praia, onde só há lugar para as pessoas que vão descansar e conversar, uma felicidade plena que cobre a pele da gente e se derrama sobre a mente e o coração.

Este é um raro prazer bravamente remanescente em minha vida.

Quando eu era jovem, era maior o prazer: tratava-se de eu me banhar e mergulhar nas águas claras e quentes da praia de Jurerê, uns 200 mergulhos por dia, deliciosos mergulhos, dulcíssimos orgasmos hedônicos que nunca mais pude desfrutar porque a água não pode mais entrar, com nenhuma gota, em meus ouvidos, se entrar terei de me submeter a arriscada cirurgia.

Mergulhar na água quente e clara do mar faz parte dos meus melhores devaneios de saudade.

Nunca mais me sairão da memória os milhões de mergulhos que dei em

Acapulco, Cancún, Praias do Francês e Sonho Verde em Maceió, Jurerê, Ponta das Canas e Lagoinha, em Florianópolis, nunca mais eu poderei usufruir daqueles gozos corporais insuperáveis, resta-me apenas a esperança de que em fevereiro eu esteja debaixo do guarda-sol a saborear o camarão fresco com chope da Praia do Forte.

Quem não tem cão caça com gato e para quem está se afogando um crocodilo se parece com um tronco.

Se eu pudesse, mas não posso, gostaria neste verão de me hospedar por uma semana apenas, talvez 10 dias, no Copacabana Palace, e ficar vagabundeando entre as mesas da pérgula em volta da piscina, um coquetel de abacaxi e leite condensado e rum aqui, uma cervejinha ali, lá pelas quatro da tarde aquele corte de costela de cordeiro que tem a forma de um pirulito.

Não sei como conseguem fazer do osso o cabo e da carne que medeia a costela e o filé aquele naco em forma de esfera, no corte mais sofisticado de qualquer assado que vi em toda a minha vida.

A vida vai passando e os escassos prazeres que nos restam são os da mesa e dos copos, à beira da piscina, à beira do mar, onde eu nunca ficava nos áureos tempos, ora se eu ia rondar as beiras se a água estava sempre sendo rompida pelos meus ávidos mergulhos!

Mas o que vou fazer? Já me bastam os assanhamentos, já que não mais me fartam os intercursos.

Só me resta sonhar com a chegada do verão que vai me libertar do mais longo e terrível inverno da minha vida.

Ah, fevereiro, será fatal que venhas para encharcar de luz, de poesia, de leitura, de camarão e de chope o derradeiro prazer que me resta na Praia do Forte em Florianópolis. É triste ver como eu me contento hoje com tão pouco.

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