quinta-feira, 1 de novembro de 2007



01 de novembro de 2007
N° 15405 - Nilson Souza


O Laçador de bermuda

A estátua desceu do pedestal e invadiu minha sala de trabalho na tarde da última terça-feira. Estava descaracterizada, é verdade. Em vez da conhecida pilcha, vestia uma prosaica bermuda de brim azul.

Mas o bigode inconfundível não deixava dúvidas: era ele mesmo, o monumento que saúda os visitantes na entrada da cidade, um símbolo da nossa hospitalidade e do nosso mais saudável orgulho de pertencer ao Rio Grande.

Oitenta anos completados em julho passado, João Carlos DÁvila Paixão Côrtes, o Laçador em carne e osso, deu um show de conhecimento, simpatia e vitalidade para um público de seis pessoas - este cronista curioso e seus companheiros da lida diária de pealar letrinhas.

Questionei-o sobre tudo o que me veio à cabeça, até levá-lo para o terreno da música tradicionalista. Então, lembrei-me da enquete que o Macedão está fazendo no seu programa matinal da Rádio Gaúcha, e perguntei-lhe de supetão:

- Qual a canção que você escolheria como hino popular do Rio Grande?

O gauchão não perdeu o embalo. Disse que cabe ao povo rio-grandense fazer esta escolha, mas que receberá com agrado os votos para a música de Simão Goldman, que ele mesmo interpreta e que se chama exatamente Hino ao Rio Grande. Disse e cantou, para não deixar dúvidas: "Rio Grande do Sul,/ o gaúcho quer cantar/ a querência, o céu azul,/ os verdes pampas e o mar..."

Para manter o clima, fiz rodar no meu computador o mini-CD que acompanha o livro Flores da Cunha de Corpo Inteiro, de Lauro Schirmer, que abre com a interpretação de Paixão Côrtes do épico O Caudilho, música de Antonio Augusto Fagundes e Airton Pimentel.

Então o Laçador cresceu dentro de suas bermudas e acompanhou a própria voz, com gestos entusiasmados. Show. Depois disso, contou histórias, falou de seu trabalho de pesquisador da cultura gaúcha e ainda deu uma sapateada na sala, para nos fazer entender melhor determinado passo de dança.

Só então retirou-se, lépido e faceiro, provavelmente para retomar a sua condição de monumento.

Fiquei pensando no poema de Jayme Caetano Braun que faz parte do mesmo disco. Termina com versos definitivos: "Nunca haverá outro Rio Grande/ nem outro Flores da Cunha". Nem outro Jayme Caetano Braun. Nem outro Paixão Côrtes.

Haja pedestal!

Ainda que com chuva que teima em não parar, que tenhamos todos uma ótima quinta-feira, véspera de Feriadão.

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