A hora de agradar o chefe
Rafael Souto
Tenho observado como o jogo político dentro das organizações está ultrapassando limites da razoabilidade. É fato que fazer propaganda do próprio trabalho é importante.
No entanto, isso funciona como lenha na fogueira das vaidades. Reforça comportamentos nos quais as pessoas precisam defender suas áreas e seus cargos com unhas e dentes.
Essa exposição, se feita demasiadamente, produz vários efeitos colaterais. Um dos mais evidentes é o isolamento entre as áreas, que assistem aos seus diretores trocando gentilezas entre si, construindo muros e torcendo para o fracasso alheio.
A consultoria McKinsey fez um recente estudo no qual revela que o número de níveis hierárquicos caiu, em média, de 16 para sete, em grandes empresas nos últimos 10 anos.
O que parecia ser uma redução de burocracia e ganhos de agilidade mostra que as responsabilidades ficaram maiores e a quantidade de pessoas para executar diminuiu.
É só conversar com os gestores de empresas, preferencialmente os de média gestão. Eles vivem o pior dos mundos. São pressionados pela operação para dar conta do recado e estão distantes das decisões estratégicas.
Nesse sentindo, há um interessante ensaio do professor da Universidade de Berlim, Byung Chul Han, chamado O Cansaço das Demandas, que conclui que o excesso de responsabilidades e a dificuldade de atendê-las vão criando sobrecargas. A sensação é única e nada prazerosa: de estar sempre devendo.
O efeito mais nocivo dessa síndrome de carregador de piano é a necessidade de estar sempre alinhado com o chefe. Isso significa concordar com o que está sendo falado e decidido.
Consequentemente, os profissionais ficam cada vez mais especializados na adequação das ideias do seu líder e nas respostas que o agradem. Evitam divergências, assumem poucos riscos e aguardam as decisões serem tomadas para acompanharem a onda. O maior desafio é se manterem no poder.
Um levantamento do site americano Career Builder mostra que apenas 34% dos jovens querem cargos de liderança. Um dos motivos é que eles não querem perder suas identidades. Pertencem a uma geração que recebeu mais liberdade. Conseguem ler a toxidade das empresas mesmo com inúmeras fantasias sobre o trabalho e repudiam um modelo de liderança baseado no comando, controle e intenso jogo político.
Aos que seguem sua jornada ao Olimpo, saibam que a arte de agradar o chefe será uma das mais valorizadas. Mas tentem sobreviver porque amanhã tem nova reunião e a pauta é inovação.
Rafael Souto escreve às sextas-feiras, mensalmente. Amanhã, Alfredo Fedrizzi.
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