06 DE JANEIRO DE 2018
PAULO GERMANO
O SEGREDO DE ROBERTO JEFFERSON
Roberto Jefferson é um homem gentil. Gentil é pouco, ele é afetivo mesmo, carinhoso, de uma amabilidade contagiante. Roberto Jefferson é um queridão, essa é que é a verdade.
Também é um corrupto confesso, claro, mas isso não me interessa agora. Você diz seu nome a Roberto Jefferson uma única vez, e nunca mais, nem daqui a 15 anos, ele chamará você de outra coisa que não seja seu nome.
Aliás, ele certamente não sabia o nome da repórter que perguntou, durante aquela entrevista a um grupo de jornalistas em frente ao Palácio do Jaburu, por que ele estava chorando. Pouco antes, Michel Temer havia confirmado a filha de Jefferson como a nova ministra do Trabalho.
- É um resgate, sabe, querida? - respondeu ele à repórter, a quem só chamou de querida porque não sabia seu nome, para depois repetir mirando o horizonte: - É um resgate...
Isso tudo com a voz trêmula e os olhos encharcados. Referia-se a um resgate da dignidade de sua família, que padeceu quando Jefferson foi cassado, condenado e preso por causa do mensalão. Hoje, depois desse fundo do poço, o ex-deputado figura de novo entre os homens mais influentes da República. Como ele conseguiu?
Porque é um psicopata? Um dissimulado? Porque tem dinheiro, e dinheiro compra tudo?
Peguemos outro exemplo.
Paulo Maluf, talvez o maior símbolo de corrupção da nossa história recente, dá presente aos funcionários no aniversário e abraça qualquer pessoa que o aborde na rua. Uma vez - eu não estava lá, mas um colega estava -, quando a Justiça aceitou mais uma denúncia contra ele, jornalistas de todos os veículos de São Paulo posicionaram-se em frente à sua cinematográfica mansão nos Jardins. O sol era forte e o pessoal já buscava uma sombra para entrevistar o homem por ali, até que a porta se abriu.
- Entrem, meus amigos, a casa é de vocês! - sorriu Maluf, estendendo a mão para cada um deles.
E, num canto da gigantesca sala de estar, havia uma mesa com biscoitos, sanduíches, refrigerante, café e suco de laranja. Boa parte dos repórteres se atracou na comilança e, na hora da entrevista, o anfitrião sorriu de novo:
- Não esqueçam que só o doutor Paulo (Maluf se refere assim a ele mesmo) é quem dá cafezinho! - e todos gargalharam, desarmados.
José Sarney, quando era presidente do Senado, conseguiu um emprego e liderou uma vaquinha para ajudar um pobre coitado que invadiu a Casa e, equilibrando-se sobre o parapeito da galeria mais alta do plenário, ameaçou se matar porque tinha fome. Minha amiga Kelly Matos, que durante anos cobriu o Congresso em Brasília, sempre se impressionou com a amabilidade de dois controversos senadores: Renan Calheiros e Romero Jucá.
Não é à toa que todos estão no poder há décadas. Talvez um que outro seja, de fato, psicopata, mas não são suas condições psíquicas que os levaram até onde estão. Tampouco foi o dinheiro. Porque o dinheiro pode comprar as pessoas por um curto período, mas o que faz delas aliadas durante uma vida inteira é isso aqui, ó: afeto.
Se você dá afeto, se presta atenção no outro, se sorri para as pessoas e consegue ajudá-las, aí a dívida de gratidão torna-se eterna. No ambiente profissional, isso é comum demais: conheço o chefe de uma faculdade que há anos prejudica o próprio trabalho por conta do alcoolismo, mas durante décadas ele foi tão generoso com os colegas, que ninguém tem coragem de demiti-lo.
As pessoas duram mais em seus cargos, têm mais tempo de sucesso quando são afetuosas. Se meter a mão no dinheiro público faz parte do cargo, dificilmente alguém vai delatar esse larápio - nosso consolo é que Maluf enfim foi preso. Só que aos 86 anos.
Eu aqui, sem refletir muito, consigo pensar em pelo menos 10 profissionais mais talentosos do que eu, mas que, por serem grosseiros, turrões ou geniosos demais, não conseguiram até hoje decolar na carreira. Gosto do capítulo 13 da carta aos coríntios, em que Paulo diz o seguinte: "E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria".
Ninguém chega a lugar algum sem amor. É ele que compra as pessoas. É o que fez Roberto Jefferson se reerguer, é o que leva as pessoas ao poder, é o que traz sucesso e felicidade. Mas a Justiça precisa estar acima de tudo - inclusive do amor.
PAULO GERMANO
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