quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009



05 de fevereiro de 2009
N° 15870 - L.F. VERISSIMO


No motel

Uma vez imaginei como seria uma quarentena num motel. O motel é fechado por alguma razão. Justamente naquela hora – fim de tarde, numa sexta-feira – em que, em todo o mundo, a frequência nos motéis é mais alta. Ninguém pode entrar e, pior, ninguém pode sair.

– Como, não posso sair? O que eu vou dizer para a minha mulher?

Quarenta minutos de atraso para chegar em casa a gente explica, quatro horas a gente explica... Mas quarenta dias?!

– E eu que disse pro meu marido que eu só ia fazer os pés?

As cenas de desespero se repetem. Todos recorrem ao celular.

– Alô, meu bem? Olha, estou numa reunião importantíssima. Ninguém sabe quando vai terminar. Faz o seguinte: deixa comida pra mim na geladeira. Bastante comida.

– Alô, querido? Você não sabe o que me aconteceu. A mão da pedicure escapou e ela me cortou um dedo. Não, eu ainda tenho o dedo, mas o corte foi fundo. Tive que vir para o hospital e... Não, não adianta você vir pra cá. Só vou ficar mais um pouquinho porque ainda estou meio fraca.

A recomendação é que todos fiquem em seus quartos. O motel fornecerá refeições, todo o equipamento dos quartos, como a cama giratória, a luz negra e a banheira com centrífuga, continuarão funcionando normalmente e a programação do circuito interno de TV continuará a mesma. Mas aos poucos as pessoas começam a sair dos seus quartos e perambular pelos corredores. Há encontros inesperados.

– Epa, você por aqui?

Todos se visitam e comentam a decoração dos quartos.

– O nosso não tem essa poltrona com vibrador...

E surgem os boatos.

– Sabem quem está na suíte 12?

Com o tempo se estabelece uma rotina. Reúnem-se na Suíte Afrodite, a maior de todas, para bater papo e olhar a televisão. Sentem falta de um baralho, mas quem leva baralho para um motel?

– Meu bem? Olha, o hospital quer que eu fique mais um pouco. Para evitar a gangrena. O quê? Você está ouvindo gemidos?

Ela faz um gesto para alguém baixar o volume da televisão.

– Aqui é um hospital, né, amor? Só se ouve gemidos.

No 20º dia, uma comissão procura a gerência do motel para fazer uma reclamação. A TV interna não tem outros filmes, não? Ninguém aguenta mais o filme das lésbicas com o encanador, ou da loira e o garanhão.

– Não tem A Noviça Rebelde?

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