quinta-feira, 17 de abril de 2025


17 de Abril de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

No pôquer entre EUA e China, quem tem melhor mão?

Sem saber as regras do jogo, o mundo assiste atônito a uma disputa com alto potencial destrutivo de riqueza. A guerra comercial deflagrada por Donald Trump ainda afeta ao menos 184 países - descontando a ilha habitada apenas por pinguins e focas -, mas se focou sobre a China com o adiamento de efeitos para além das tarifas de 10% por 90 dias.

Também não se sabe com exatidão qual será o prêmio do vencedor, mas não parece pequeno: é algo como comandar os rumos da humanidade. Envolve troca de cartas (10%, 25%, 125%), blefes (tarifas sobre chips) e um jogador que paga para ver (retaliação da China até 125%), então se parece com um pôquer em que cada ás vale um quarto do PIB do planeta.

Neste momento, a tentativa de todos os envolvidos é entender quem tem a melhor mão: EUA ou China, Trump ou Xi Jinping, a maior economia do mundo ou a segunda. Não é tarefa simples, dadas as características pessoais, culturais e econômicas dos competidores. O retrospecto favorece a maior economia do planeta, cuja concentração de riqueza só cresce.

Os EUA já venceram a maior de todas as recessões globais, nos anos 1930, e foram bem-sucedidos em evitar a ascensão de várias potências, de Japão à União Soviética - a Rússia não está entre os 185 (voltaram os pinguins...) afetados pelas tarifas de 10%.

O PIB da Califórnia, berço de big techs, foi de US$ 4,1 trilhões em 2024. Se fosse um país, seria o quarto maior do mundo, depois do Japão e antes da Alemanha. As duas maiores bolsas de valores do mundo estão nos EUA: a de Nova York (Nyse) e a Nasdaq. A moeda americana ainda domina todo o sistema de trocas do planeta, embora esteja em xeque.

O tempo beneficia o adversário, que não tem a pressa de Trump para cessar os prejuízos autoinflingidos. A China tem o trunfo da espera sem desespero, porque o país é mais autossuficiente do que os EUA. E mais: como o adversário disparou para todos os lados, também transformou o temido gigante asiático em potencial novo aliado.

Um movimento testemunhado pela coluna ilustra essa mudança. Em setembro do ano passado, o foco da União Europeia (UE) era oferecer uma alternativa ao plano de expansão global da China, especialmente ao Cinturão e Rota da Seda. Em sete meses, o antagonista virou potencial aliado. Na semana passada, o embaixador chinês na Espanha afirmou querer "parceria" com a UE contra o "abuso" dos EUA.

E ontem, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (espécie de primeira-ministra do bloco), fez uma frase de impacto sobre a atual relação com os EUA:

- O Ocidente como o conhecíamos não existe mais.

E acrescentou:

- O lado bom disso é que, agora, tenho diversas conversas com chefes de Estado e governantes de todo o planeta, que querem trabalhar conosco nessa nova ordem... Todos estão pedindo mais trocas com a Europa, não somente no campo econômico.

Nessa disputa cheia de ardis e métodos duvidosos, no minuto seguinte nada ainda é o que parecia no anterior. Se vale a máxima de "nunca apostar contra os EUA", frase famosa de Warren Buffett, também vale a que ensina que "o inimigo do meu inimigo é meu amigo". _

Sulgás corta à metade os investimentos no Estado

A Sulgás avisou à coluna que está cortando à metade sua previsão de investimentos no Rio Grande do Sul. A empresa previa aporte recorde de R$ 130 milhões, mas afirma que, por "insegurança jurídica", só se compromete com a execução de R$ 67 milhões. Isso significa que vai cancelar contratos com duas empreiteiras, que mantêm 150 empregos. Serão mantidos outros dois, focados em manutenção e segurança.

- Quando a Compass assumiu a Sulgás, no início de 2022, comprometeu-se em investir R$ 300 milhões em cinco anos. Em três anos, aplicamos R$ 250 milhões e, com mais dois, queríamos chegar a R$ 500 milhões em cinco anos. Por isso, a decisão que tomamos agora, de cortar os investimentos à metade, não está alinhada com nossos desejos. É uma reação a um contexto instável e inseguro para o investimento - disse Lucas Simone, líder institucional da Commit, uma das acionistas da Sulgás.

A gota d?água para a decisão, afirma Lucas, foi a "imprevisibilidade" das decisões da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do RS (Agergs). Segundo o executivo, a Sulgás está há 20 meses sem revisão tarifária e sem previsão de cumprimento do contrato assinado na época da privatização:

- Cumprimos integralmente o plano de investimento aprovado pelo governo do Estado, na régua (na medida exata). Mas não estão sendo reconhecidas as réguas sobre as quais foram feitos os investimentos.

A coluna consultou a agência reguladora, que enviou apenas uma declaração do conselheiro- relator do caso da Sulgás, Alexandre Porsse: "A Agergs tem decisões colegiadas, sempre na observância da legalidade".

Em 2024, o reajuste pedido pela empresa foi de 60%. Foi um ano "atípico", segundo Lucas, porque havia ocorrido forte queda no volume vendido em 2023. A compensação, sustenta o executivo, está prevista em contrato. Como seria difícil aplicar tal nível de aumento, a empresa sugeriu aplicação parcelada.

- Meses depois, a agência autorizou reajuste de 7%, que a empresa nunca aplicou, porque entrou com recurso e não alterou a tabela - disse Lucas. _

Gaúchas sob efeito do tarifaço

A sangria das bolsas de valores chega às quatro principais empresas gaúchas - mas com menor intensidade do que a observada em outras regiões do mundo, onde houve quedas históricas. Entre o anúncio do dia 2 e ontem, as ações preferenciais da Gerdau caíram 8,31%.

A gigante de aço com raiz gaúcha tem defesa relativa contra o protecionismo de Trump, uma vez que grande parte de sua produção está nos EUA, mas como há risco de recessão por lá, a vantagem perde força. E a empresa terá de lidar com a realocação do aço chinês em diversos mercados.

Já as ações SLC Agrícola subiram 8,03% no período. O que favorece os papéis, afirma Valter Bianchi Filho, sócio da Fundamenta Investimentos, é a percepção de que a agropecuária pode ser beneficiada pela guerra comercial entre EUA e China, aumentando o apetite dos dois países por grãos brasileiros.

As ações da Lojas Renner também caíram, de forma menos acentuada: 3,52%. A pressão vem da possível realocação do varejo chinês. Com menor entrada de roupas asiáticas nos EUA, mais produtos asiáticos devem vir para cá, mercado em que a Renner opera.

Já a Marcopolo não deve ser tão afetada pelo tarifaço, analisa Bianchi Filho. As ações da gigante de Caxias do Sul ficaram estáveis no período, com oscilação positiva de 3,83%.

- O mercado não gosta de incerteza. Quando há incerteza, há fuga de capital, o que significa bolsas em queda. É difícil dizer até onde vai o conflito entre Estados Unidos e China, mas não vai ser bom para ninguém - avalia Bianchi Filho. _

Gerdau -8,31%

SLC Agrícola +8,03%

Lojas Renner -3,52%

Marcopolo + 3,83%

vaivém do dólar

Em meio à restrição de exportação de chips para a China determinada por Donald Trump, o dólar no Brasil, que havia chegado a R$ 5,916 pela manhã, retomou as quedas discretas interrompidas na véspera. Fechou com queda de 0,44%, a R$ 5,865.

GPS DA ECONOMIA

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