quinta-feira, 23 de outubro de 2008



FILANTROPIA COMPULSÓRIA

Governo parece porteiro: vive dando explicações. Dificilmente convence.

É o reino desencantado da enrolação oficial. No Rio Grande do Sul, quando morre um marido, funcionário estadual, a viúva é submetida a meses de pensão pela metade, obrigada a entrar na Justiça e, não raro, a ver parte do que lhe é de direito transformado em precatórios, aquela dívida que o governo sabe que deve, não nega, mas paga quando bem entende, se paga. Outro capítulo interessante é o dos concursos.

Os candidatos enfrentam a maratona e, mesmo aprovados, não são chamados ou, o que é mais bizarro, acabam contratados emergencialmente. Não bastasse isso, são levados a trabalhar alguns meses sem receber. Já começam feito viúvas, esperando em vão, chorando, sofrendo e correndo atrás.

Se resistirem a esse teste de sobrevivência na selva pública, podem ser efetivados, sem o piso federal, pois para o governo gaúcho piso não é salário inicial.

Aqui vai um exemplo disso: 'Prezado jornalista Juremir Machado da Silva: escrevo esta carta porque a minha situação é a mesma de outros profissionais e é um exemplo do absoluto descaso e desrespeito com que o governo estadual trata a educação pública. O que acontece comigo e outros professores com certeza merece adquirir publicidade.

Sou professor de História concursado. Fui aprovado em uma ótima posição. No entanto, a governadora Yeda Crusius não renovou o concurso e meses após chamou os concursados para contrato emergencial.

Por isso, encontro-me lecionando desde junho como contratado. Mas faço questão de frisar: fui aprovado, e muito bem aprovado, em concurso público de ampla concorrência.

Dou aulas de História no curso noturno desde junho e gosto muito do que faço. Apesar de enfrentar problemas como falta de infra-estrutura e segurança nas escolas, cansaço e desinteresse de alguns discentes (o que não pode ser generalizado, de forma alguma, tenho alunos excelentes), gosto do que faço e faço com prazer.

É esse prazer que me ajudou a chegar até aqui, e talvez seja nele que se baseia o governo estadual para continuar me negando minha justa remuneração. É aquela filosofia: professor não é um profissional, o que ele faz é caridade ou militância.

Mas não faço caridade nem militância. Sou um profissional sério e até agora o governo estadual, através da Secretaria da Educação, não me pagou um mísero tostão por cinco meses de trabalho correto e dedicado.

Ao telefonar para lá exigindo (nos últimos tempos, quase diariamente) esclarecimentos, me arrolam entraves burocráticos imensos e me tratam como se eu estivesse exigindo algo impossível.

Interessante observar que para me jogar em sala de aula para tentar tapar o déficit crônico no quadro docente do Estado (e por que será que existe déficit crônico no quadro docente do Estado?) toda pressa era pouca e os entraves burocráticos inexistiam.

Mais interessante ainda é notar que minha reivindicação nada tem de subversiva: quero apenas o pagamento (mínimo, não estou sequer entrando no mérito de quanto o Estado paga aos professores) por trabalho honesto.

Como costumo ensinar pros meus alunos, essa é uma característica básica do capitalismo diante de outros sistemas de produção... Se se tratasse da iniciativa privada, passado dia 10, dê-lhe processo trabalhista...

Já na Secretaria da Educação, ouço um ‘simpático’ ‘espere até o mês que vem’. Atenciosamente, Rodrigo de Azevedo Weimer, um professor que não deseja completar meio ano sem salário'.

juremir@correiodopovo.com.br

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