23 de Outubro de 2024
EDITORIAL
A dor e o exemplo
O Rio Grande do Sul amanheceu na segunda-feira com a notícia devastadora do acidente com a van que trazia de volta ao Estado os integrantes do projeto social Remar para o Futuro, de Pelotas. Nove vidas foram abreviadas abruptamente. Morreram o motorista do coletivo, o coordenador técnico da equipe e sete atletas com idades entre 15 e 20 anos, jovens em grande parte de famílias de baixa renda que buscavam um futuro melhor por meio do esporte. A tragédia foi causada por um caminhão que colidiu com a van, na BR-376, em Guaratuba (PR). Apenas um dos passageiros sobreviveu.
Este é o momento de se solidarizar e amparar familiares e amigos pelas perdas irreparáveis. É lancinante a dor da partida de um ente querido de uma forma tão brutal. Ainda mais quando as vítimas são jovens, que pela lógica da vida ainda teriam muitos anos de convívio e realizações pela frente. Seus círculos de relações mais próximas precisarão de apoio incansável para encontrar as forças necessárias para superar o vazio que vai ficar.
Mas, além da tristeza e da saudade, deve-se guardar orgulho pela trajetória desses adolescentes. Os relatos dos conhecidos são unânimes em descrevê-los como modelares em dedicação e firmeza de propósitos. Assim como devem ser enaltecidos os méritos do Remar para o Futuro, iniciativa que une prefeitura, Academia de Remo Tissot, Clube Centro Português 1º de Dezembro e Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Com menos de 10 anos de existência, tornou-se reconhecido nacionalmente como polo de identificação de talentos e iniciação de atletas com potencial de alto desempenho no remo.
Forjar campeões e medalhistas, no entanto, é apenas um aspecto. Projetos do gênero têm uma tarefa de igual ou maior importância: formar cidadãos, ensinando a crianças e adolescentes o valor da disciplina, do respeito às regras e da consideração ao outro. O esporte, sinônimo de saúde física e mental, se investe de missão social quando beneficia jovens de periferias, mais expostos a riscos. É o caso do Remar para o Futuro, que recebia alunos da rede municipal de ensino.
Os jovens, o coordenador técnico da equipe e o motorista retornavam do Campeonato Brasileiro Unificado, disputado em São Paulo. Na competição, o grupo de Pelotas arrebatou sete medalhas e o sexto lugar na classificação geral. Com o desempenho, os esportistas tentavam se habilitar para o auxílio financeiro do programa governamental Bolsa Atleta, uma fonte de renda essencial para terem condições de se dedicar mais aos treinamentos. Estavam em busca de seus sonhos.
O único sobrevivente, João Pedro Milgarejo, 17 anos, prometeu ontem perseverar no remo. Por ele, pelos colegas que perdeu e por suas famílias. Reafirmou o objetivo de disputar Olimpíadas. Pela aspiração de Milgarejo, pela possibilidade de mais jovens continuarem a ter no esporte a esperança de uma carreira promissora ou apenas receberem ensinamentos úteis para a vida adulta, o Remar para o Futuro deve passar a ser ainda mais apoiado. Hoje não recebe nenhum financiamento, mas apenas ajudas pontuais. Olhar semelhante pode ser direcionado a inúmeras iniciativas equivalentes, dedicadas a moldar atletas e cidadãos, existentes por todo o Estado.
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