quinta-feira, 10 de outubro de 2024


10 de Outubro de 2024
INFORME ESPECIAL - Rodrigo Lopes

A guerra que eu vi agora - e a de um ano atrás

Esta é uma guerra mais difícil de se cobrir jornalisticamente falando do que a de um ano atrás. Quando desembarquei em Israel, em outubro de 2023, o país havia passado pelo maior atentado de sua história - 1,2 mil mortos e mais de 250 reféns levados para Gaza depois da incursão macabra do grupo terrorista Hamas no dia 7.

A resposta militar à Faixa de Gaza era gestada. Eu voltava ao Oriente Médio pela primeira vez desde a guerra de 2006, entre o governo israelense e Hezbollah, conhecida como a Segunda Guerra do Líbano. Naquela, eu havia concentrado as atenções no norte de Israel e, depois, ingressado em Beirute e ido até o sul libanês em meio a bombas.

Em 2023, circulei pela primeira vez nos arredores da Faixa de Gaza, fiquei na linha de tiro dos foguetes do Hamas, em Sderot, e testemunhei o horror nos kibutzim invadidos pelos fanáticos.

Mas aquela guerra que começava, por incrível que pareça, era mais fácil de cobrir: a geografia era mais limitada, o Hamas havia atacado primeiro e, em seguida, se entocado nos túneis de Gaza com os cativos - e havia muito sofrimento a relatar.

Voltei a Israel na semana passada para cobrir a passagem de um ano daquele massacre - e, por tabela, o novo front no Norte. Cobrir a fronteira com o Líbano impõe desafios logísticos - a área montanhosa é imensa, os vilarejos estão fantasmas, fica-se muito perto do muro entre Israel e Líbano, avista-se as cidades do outro lado - e, obviamente, o Hezbollah também nos vê. 

Chegar a Kyriat Shmona, no chamado Dedo da Galileia, como chegamos na quinta-feira passada, exige planejamento logístico - não pode faltar combustível no caminho, sabe-se que, ao longo da estrada, não há abrigos antiaéreos e, se as sirenes tocarem, o máximo que se poderá fazer é parar o carro, manter a calma, descer do veículo e deitar-se no chão até que elas parem.

Na linha de fronteira, você precisa se acostumar com os estrondos da artilharia - e apostar que elas são israelenses, do lado da fronteira onde você está.

Porque, se for um foguete do Hezbollah, você ouvirá apenas um silvo longo zunir e, com sorte, o artefato será explodido no ar pelo sistema antiaéreo - e precisa ainda torcer para os estilhaços não caírem por perto.

O primeiro problema - e esse é um dos fatores pelos quais essa é uma guerra mais difícil de se cobrir - é que o atual conflito revela fragilidades do poderoso Domo de Ferro israelense. Ele pega 99% dos foguetes dos dois grupos terroristas. Mas alguns caem e ferem. O segundo problema é que o Hezbollah tem maior poder de fogo do que o Hamas - além de foguetes, lança mísseis. Sem falar de que essa guerra já não é sobre um território minúsculo como Gaza, e envolve, além do Hezbollah, no Líbano, Estados nacionais como o Irã e a Síria, duas potências militares do Oriente Médio.

O Norte é tão complexo que um simples erro de cálculo pode deflagrar a tão temida guerra regional - ou, quem sabe, um conflito de proporções globais. O Dedo da Galileia, onde estive, é o epicentro explosivo da região. De um lado, Israel, do outro Líbano, ali ao lado as Colinas de Golã, estratégicas para todos e disputadas por Israel e Síria. Sem dúvida, essa é uma guerra muito pior. E, tudo indica, vai ficar ainda mais grave. _

No meio do conflito, há uma solução de paz?

Em meio a tudo isso, como falar de paz? Dois estudiosos da Ciência Política, um palestino, Omar Dajani, codiretor da Escola de Direito Global Center for Business & Development, e outro israelense, Limor Yehida, da Carnegie Endowment for International Peace, ousam uma hipótese em artigo na incensada revista Foreign Affairs.

O mais conhecido caminho é a solução de dois Estados. Mas e se esse fosse apenas um passo para uma solução mais ousada, uma confederação entre os dois grupos étnicos e religiosos? Já foi feito no passado: a Suíça em 1848, que a partir de diferenças nacionais criou entre franceses, alemães e italianos uma instituição política única, e a própria União Europeia (UE).

Para que isso ocorra, ambos os lados do conflito no Oriente Médio terão de superar o ódio, o rancor e entrar em acordo. Na imagem acima, equipes procuram sobreviventes no local de um ataque aéreo israelense que atingiu um prédio de apartamentos no vilarejo de Wardaniye, ao sul de Beirute. _

Ameaça regional

Passando pela Jordânia, ao entrar e sair de Israel nesta cobertura, reflito sobre a ameaça de a Jordânia ser dragada para a guerra. Em 1994, o país foi o segundo a assinar a paz com Israel, depois do Egito. Em seu território, está a base americana conhecida como Torre 22, próximo à fronteira com a Síria. Além disso, pode ser pretexto o fato de a Jordânia ter cedido espaço aéreo para Israel abater os mísseis iranianos que cruzaram seu território no ataque do dia 1º. _

Trégua futura?

Não se pode falar em acordo de paz, no mínimo um cessar-fogo, mas, a essa altura, já é alguma coisa: na terça-feira, o vice-comandante do Hezbollah, Naim Qassem, disse que apoia as tentativas de trégua na fronteira do Líbano com Israel, em discurso na TV. No Oriente Médio, mais importante do que é dito é aquilo que não é falado: pela primeira vez, um chefe do grupo terrorista não mencionou o fim da guerra na Faixa de Gaza como precondição para encerrar os combates. 

INFORME ESPECIAL

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