02 DE ABRIL DE 2024
NÍLSON SOUZA
O medo que vem do céu
Os valentes gauleses da aldeia de Asterix só tinham um temor na vida, o de que o céu lhes caísse sobre as cabeças. A origem dessa crendice espertamente adaptada pelos roteiristas da revistinha é atribuída aos celtas da Antiguidade. Uma das lendas sobre o conquistador Alexandre, o Grande, da Macedônia, conta que certa vez, depois de uma de suas invasões, ele perguntou aos druidas celtas o que lhes causava mais medo - esperando ouvir o seu próprio nome, pois impunha sua dominação pelo terror e se orgulhava disso. A resposta dos sábios deixou-o desconcertado:
- Só temos medo - disse o porta-voz dos subjugados - que o céu caia sobre nossas cabeças!
Como naquele tempo a Terra era plana na visão da quase totalidade de seus habitantes, o temor não era de todo absurdo. Ainda assim, passou ao imaginário popular de vários povos como sinônimo de qualquer medo sem fundamento. Porém, agora que a Terra é inquestionavelmente esférica e flutua no espaço (não para todos, é verdade), nem deveria haver motivo para uma preocupação desse tipo. Ainda assim, aquele medo atávico me atormenta cada vez que vejo o céu escurecer em pleno dia, o que vem ocorrendo com frequência.
Na verdade, minha preocupação maior é ser surpreendido no trânsito por uma chuva de granizo, dessas que costumam vir embutidas no tal pacote completo seguidamente anunciado pelos previsores midiáticos. Granizo não é brincadeira. Meu terror com as pedrinhas de gelo que descem do céu aumentou ainda mais depois que vi aquele filme argentino do meteorologista que não errava previsões.
Durante 20 anos, o homem reinou soberano e tornou-se uma celebridade televisiva - até o dia em que previu tempo bom para os portenhos e uma chuva de granizo arrasou Buenos Aires. Nos meus momentos de paranoia pré-chuva, me imagino aquele taxista que confiou cegamente na previsão, teve seu carro destruído e depois passou a perseguir o meteorologista para um acerto de contas. Aqui nem isso será possível fazer, pois, pelo que ouço seguidamente, o Cléo Kuhn não se coça nem para oferecer um churrasco aos amigos.
E o mais assustador é que não adianta rezar para Santa Bárbara quando troveja, nem apelar para o padroeiro do nosso Estado, São Pedro, a quem se atribui o poder de fechar as portas e as comportas do céu. Se acham que exagero, vejam o que aconteceu em Porto Alegre na última Sexta-Feira Santa: Jesus Cristo sequer pode ser crucificado na procissão do Morro da Cruz porque uma tempestade repentina - com granizo, inclusive - colocou sob risco os atores da encenação e o próprio público.
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